sábado, 22 de agosto de 2009

Gameplay - impressões gerais

Como havia divulgado em junho, está acontecendo em SP a exposição Gameplay, no Itaú Cultural. Vai até o fim desse mês.
Eu fui ao fim de junho, mas somente agora consegui esse tempinho para comentar e pontuar algumas impressões.

Um dos carros-chefe da divulgação da exposição seria o fato de ela discutir o conceito de Gameplay. Essa discussão é feita logo na entrada, em um jogo estilo plataforma que, sem recursos sonoros e com o visual desenhado para dar uma aparência de esboço, evidencia o conceito de "gameplay" como as possibilidades de ações e relações de interação homem-máquina, o que é feito de maneira bem-feita interessante e didática.

Além desse, destaco como outros pontos positivos três instalações.

Em Kino Arcade Machine , de Windows Media Players, é possível estabelecer uma discussão sobre narrativa e interação como intervenção. A proposta consiste em colocar em uma máquina de fliperama o filme "Encouraçado Potemkim". Os botões diversos do fliperama, controlados pelo usuário, promovem modificações diversas na apresentação do filme: avançam e voltam as cenas, colorizam de diversas maneiras, "pixelam" as imagens e assim por diante. Obviamente, a narrativa em si continua sendo ditada pelo filme, mas é interessante essa sobreposição de possibilidades e a ideia de que eu posso fazer meu próprio Potemkim.

Merece destaque também Diorama Table, de Keiko Takamashi. Consiste em uma mesa em que elementos pintados pela artista plástica (dinâmicos) são projetados. O interessante é que é uma "pintura sensitiva". Ou seja, a mesa reage aos mais diversos objetos pretos que são colocados sobre ela. Explicando: há um fundo azul, em que, a princípio, não é projetado nenhum objeto. Colocando alguns objetos pretos na mesa, surgem elementos 2D em seu entorno. Algumas possibilidades:
- Coloca-se uma xícara preta: ao redor começa a surgir uma cidadezinha. Logo começam a aparecer nuvens de poluição. Ao se retirar a xícara, sai um gato de dentro.
- Estica-se uma corda: o caminho da corda transforma-se em trilho, por onde passam trens. Colocar dois trilhos em contato pode fazer os trens colidirem.
- Usar a corda para fazer um círculo: cria-se um lado. Surgem patos no lado. Ao tirar a corda, os patos voam.
- Garfo preto: funciona como uma espécie de túnel, de onde saem os carros.
- Uma "bala": atrai o gato.

A esses sprites, que reagem aos objetos pretos como se esses fossem dispositivos de entrada, correspondem também alguns sons. Muito interessante...

Em World Skin, um universo virtual construído com fotos/sprites de ambiente de guerras pode ser percorrido pelo jogador. Munido de uma máquina fotográfica, o jogador pode "capturar" as telas (que são impressas como fotos). Ocorre que as telas são de fato "capturadas", ou seja, as imagens são recortadas do mundo, que fica com espaços em branco. É interessante pensar na materialidade da foto no ambiente 3d. Também é um ambiente imersivo paradoxalmente "contraimersivo", já que desperta o olhar para o fato de que aquilo é uma construção gráfica, no melhor estilo brechtiano...


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Além dessas três instalações, havia mais umas três, se não me engano, mas com propostas não tão interessantes, ou que não aproveitavam os espaços e os recursos para trazer algo inovador ou reflexivo. Ou que, pelo menos, não discutiam o Gameplay.

De resto, uma certa decepção. Nenhuma outra discussão (seja teórica ou artística) sobre jogos, apenas uma quantidade imensa dos mais diversos jogos de console para serem jogados pelos visitantes (com o tempo máximo de 15min). E estamos falando de jogos como Halo, Mario Kart e assim por diante. Ou seja, uma lan-house comunitária para que o jogador tenha acesso ao que a indústria de games vem criando. Um bom lobby para o pessoal e um bom incentivo para que as crianças que queiram ficar mais de 15min jogando peçam aos pais os joguinhos. Nada contra a divulgação gratuita de jogo, é uma estratégia de marketing interessante. Mas... em que isso enriquece o debate sobre o gameplay?

Em suma, as coisas boas da exposição ficaram "embotadas", ao meu ver, por esse foco na disponilização sem critério aparente de jogos comerciais a serem jogados pelo visitante. O que é inicialmente discutido na entrada sobre gameplay não é retomado em nenhum momento da exibição. Os ditos "educadores", por mais simpáticos que fossem, não tinham a arquitetura do evento ao seu favor. Quase nenhuma informação sobre as instalações ou sobre o que é gameplay se apresentavam ali na exposição, seja em forma de texto ou em qualquer outra forma.

Imagino que ainda seja muito difícil fazer uma exposição que discuta jogos de um modo diferenciado (como arte, como cultura). Imagino (ou quero imaginar) que a quantidade de jogos disponíveis foi uma alternativa dos organizadores para suprir a falta de trabalhos nesse sentido. Mas duas coisas ficaram claras: é excelente ver que o conceito de gameplay está sendo colocado em pauta; ainda temos muito o que caminhar.

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