Marisa tinha um projeto ambicioso, embora simples. Tal projeto envolvia dois fatores: (1) ela queria que as pessoas não morressem por falta de recursos; (2) ela queria viver nesse mundo, não morrer lutando por ele.
Em primeiro lugar, Marisa pensou que, sendo colaborativa ao próximo, além de se aproximar de pessoas que fariam o mesmo, ela daria um grande passo. De fato, os recursos que ela possuía aumentaram e as pessoas com quem ela se relacionava costumeiramente a auxiliavam. Caso alguém não colaborasse, ela não retaliava, apenas deixava de procurá-lo. Assim, enriqueceu. Mas seu projeto foi por água abaixo, pois muitos outros, com quem ela não se relacionava, morreram.Deram uma nova chance a Marisa. Dessa vez, mais experiente, não foi seletiva em suas trocas. Nisso residia outra espécie de ingenuidade: as pessoas não colaboravam com ela, e seus recursos foram diminuindo. Ao oferecer sempre a outra face, acabou estapeada e sem recursos.
Em sua última chance, restabeleceram seus recursos e a chance de se relacionar com os outros. Agora, colaborava muito, mas retaliava aqueles que não faziam o mesmo. Uma espécie de castigo, que nunca era superior ao tanto que retribuía quando bem recebida. Não bastasse isso, influenciava as pessoas a agirem desse modo. E informava a todos suas experiências naquele contexto, tentando dar aos outros seu olhar sobre tudo aquilo. No início, Marisa quase sucumbiu. Nesse momento de desespero, aproximou-se de quem mais lhe ajudava. Logo fortalecida, passou a se relacionar com todos. Na comunidade em que vivia, as pessoas sobreviveram e, aos poucos, começaram a colaborar umas com as outras.
Essa narrativa é uma maneira de contar ou reinterpretar a sucessão de acontecimentos de minha trajetória em uma partida do jogo Sim Dilema, desenvolvido por Janos Biro. O jogo em questão consiste em uma simulação baseada no dilema do prisioneiro, mas envolvendo uma complicação um pouco maior (há mais agentes envolvidos) e alguns elementos reguladores, propostos pelo autor, como relações entre recursos, desigualdade e consumo. Sugiro que a leitura do que virá a seguir seja feita após a execução do jogo e de um conhecimento básico sobre o dilema mencionado.
Quando, há muito tempo, comentei "The Free Culture Game", mencionei que era um jogo que operava mais como manifesto do que teoria, alcunha esta usada e divulgada por seu autor. E minha justificativa foi: o jogo encerra possibilidades de ação frente ao problema proposta, tomando a si mesmo como exemplo disso. Ou seja, um apelo persuasivo a agir conforme sugerido. Isso não é um problema, mas me gerou uma inquietação: como um jogo pode operar como uma teoria?
Sim Dilema faz isso. Talvez por isso seja denso. Talvez por isso seja tão pouco (ou nada) comentado, apesar de o autor tê-lo divulgado em inúmeros sites. Já o havia jogado, mas confesso que tive dificuldades, então, de construir sentidos. De operar com o jogo de um modo um pouco além do aleatório. De conseguir transformar minhas ações no programa em narrativas como fiz acima. Para tudo isso ser possível, precisei estudar antes de jogá-lo novamente. Tal como fazemos ao ler um poema, um artigo ou mesmo ver um filme que não entendemos. Depois de tudo isso, retornei ao jogo, ao seu manual e a alguns dos desafios propostos.
O que "Sim Dilema" faz de mais interessante, na minha opinião, é estabelecer uma reflexão sobre uma outra possibilidade de encarar jogos de gerenciamento de recursos. A inquietação do autor, nesse sentido, é clara, como é possível perceber neste comentário, em seu blog. Simula-se e se propõe a discutir, no jogo, noções como "colaboração", "desigualdade", "confiança", "coletividade". Desloca-se a ideia de "sucesso" como vitória de um, subjugando os demais (nesse jogo, isso é fracassar), o que provoca um contra-discurso interessante. E, mais que tudo, apesar de haver alguns "desafios", propostos pelo autor, que direcionam o jogo, sua base é, em si, a modalidade "sandbox", que permite a exploração de vários caminhos e possibilidades.
Obviamente, como toda simulação é uma redução, deve-se "entrar" no argumento do autor para que ele funcione. Não há explicação para o "número mágico" de 400 dias de prazo para manter todos sobrevivendo. Também não se apresentam os pressupostos que sustentam a relação direta entre "quantidade total de recursos" e "consumo diário de recursos". E isso, óbvio, interfere nas reflexões feitas, na sensação de sucesso ou fracasso e assim por diante. Fica a dica para uma próxima versão do jogo: criar, em algum local, um documento procurando explicar as escolhas e os pressupostos que sustentam o jogo (ou pelo menos sugerir que os jogadores entrem em contato com o autor para perguntar sobre isso).
Nos "desafios", é interessante a presença de perguntas, em vez de conclusões (o que, mesmo direcionando a reflexão, não a encerra, como ocorre no "Free Culture Game"). Por outro lado, não há uma consideração que as perguntas feitas e os desafios dependem intrinsicamente da estrutura proposta pelo próprio autor para gerarem resultado. São as escolhas que ele faz na construção do jogo que conduzem aos efeitos. Some-se a isso a recomendação para "mexer o mínimo possível": além de não ser tão precisa (quanto seria esse "mínimo"?), não é justificada (por que essa recomendação é feita?). Isso acabou me levando à ideia de que "deve ser assim para funcionar". Mas são detalhes que não tiram o brilho do projeto.
Como consideração final, eu gostaria de ressaltar que o Sim Dilema ainda tem um grande mérito: assume-se enquanto argumentativo (ou, melhor, como UMA possibilidade de enxergar o mundo). Além de explicar sua fundamentação (dilema do prisioneiro), sua motivação (pensar em um jogo de soma não nula, baseado na teoria dos jogos) está disponível em um site em que o posicionamento do autor é apresentado. Ou seja, podemos debater o argumento, questionar os efeitos do jogo, gerar um debate a partir disso, tal como fazemos com demais artefatos culturais. Não precisamos concordar com o autor (mas somos levados a argumentar para defender nosso ponto de vista, caso isso ocorra).
Assim, o jogo não possui a armadilha encontrada em "blockbusters" como Civilization ou The Sims, que se assumem como "entretenimentos neutros", disseminam-se como "universais" (todas as nações buscam um mesmo objetivo; todas as famílias são alfabetizadas e proprietárias de imóveis) e generalizam noções, sobre os assuntos que abordam, que são locais.
Em sua última chance, restabeleceram seus recursos e a chance de se relacionar com os outros. Agora, colaborava muito, mas retaliava aqueles que não faziam o mesmo. Uma espécie de castigo, que nunca era superior ao tanto que retribuía quando bem recebida. Não bastasse isso, influenciava as pessoas a agirem desse modo. E informava a todos suas experiências naquele contexto, tentando dar aos outros seu olhar sobre tudo aquilo. No início, Marisa quase sucumbiu. Nesse momento de desespero, aproximou-se de quem mais lhe ajudava. Logo fortalecida, passou a se relacionar com todos. Na comunidade em que vivia, as pessoas sobreviveram e, aos poucos, começaram a colaborar umas com as outras.
Essa narrativa é uma maneira de contar ou reinterpretar a sucessão de acontecimentos de minha trajetória em uma partida do jogo Sim Dilema, desenvolvido por Janos Biro. O jogo em questão consiste em uma simulação baseada no dilema do prisioneiro, mas envolvendo uma complicação um pouco maior (há mais agentes envolvidos) e alguns elementos reguladores, propostos pelo autor, como relações entre recursos, desigualdade e consumo. Sugiro que a leitura do que virá a seguir seja feita após a execução do jogo e de um conhecimento básico sobre o dilema mencionado.
Quando, há muito tempo, comentei "The Free Culture Game", mencionei que era um jogo que operava mais como manifesto do que teoria, alcunha esta usada e divulgada por seu autor. E minha justificativa foi: o jogo encerra possibilidades de ação frente ao problema proposta, tomando a si mesmo como exemplo disso. Ou seja, um apelo persuasivo a agir conforme sugerido. Isso não é um problema, mas me gerou uma inquietação: como um jogo pode operar como uma teoria?
Sim Dilema faz isso. Talvez por isso seja denso. Talvez por isso seja tão pouco (ou nada) comentado, apesar de o autor tê-lo divulgado em inúmeros sites. Já o havia jogado, mas confesso que tive dificuldades, então, de construir sentidos. De operar com o jogo de um modo um pouco além do aleatório. De conseguir transformar minhas ações no programa em narrativas como fiz acima. Para tudo isso ser possível, precisei estudar antes de jogá-lo novamente. Tal como fazemos ao ler um poema, um artigo ou mesmo ver um filme que não entendemos. Depois de tudo isso, retornei ao jogo, ao seu manual e a alguns dos desafios propostos.
O que "Sim Dilema" faz de mais interessante, na minha opinião, é estabelecer uma reflexão sobre uma outra possibilidade de encarar jogos de gerenciamento de recursos. A inquietação do autor, nesse sentido, é clara, como é possível perceber neste comentário, em seu blog. Simula-se e se propõe a discutir, no jogo, noções como "colaboração", "desigualdade", "confiança", "coletividade". Desloca-se a ideia de "sucesso" como vitória de um, subjugando os demais (nesse jogo, isso é fracassar), o que provoca um contra-discurso interessante. E, mais que tudo, apesar de haver alguns "desafios", propostos pelo autor, que direcionam o jogo, sua base é, em si, a modalidade "sandbox", que permite a exploração de vários caminhos e possibilidades.
Obviamente, como toda simulação é uma redução, deve-se "entrar" no argumento do autor para que ele funcione. Não há explicação para o "número mágico" de 400 dias de prazo para manter todos sobrevivendo. Também não se apresentam os pressupostos que sustentam a relação direta entre "quantidade total de recursos" e "consumo diário de recursos". E isso, óbvio, interfere nas reflexões feitas, na sensação de sucesso ou fracasso e assim por diante. Fica a dica para uma próxima versão do jogo: criar, em algum local, um documento procurando explicar as escolhas e os pressupostos que sustentam o jogo (ou pelo menos sugerir que os jogadores entrem em contato com o autor para perguntar sobre isso).
Nos "desafios", é interessante a presença de perguntas, em vez de conclusões (o que, mesmo direcionando a reflexão, não a encerra, como ocorre no "Free Culture Game"). Por outro lado, não há uma consideração que as perguntas feitas e os desafios dependem intrinsicamente da estrutura proposta pelo próprio autor para gerarem resultado. São as escolhas que ele faz na construção do jogo que conduzem aos efeitos. Some-se a isso a recomendação para "mexer o mínimo possível": além de não ser tão precisa (quanto seria esse "mínimo"?), não é justificada (por que essa recomendação é feita?). Isso acabou me levando à ideia de que "deve ser assim para funcionar". Mas são detalhes que não tiram o brilho do projeto.
Como consideração final, eu gostaria de ressaltar que o Sim Dilema ainda tem um grande mérito: assume-se enquanto argumentativo (ou, melhor, como UMA possibilidade de enxergar o mundo). Além de explicar sua fundamentação (dilema do prisioneiro), sua motivação (pensar em um jogo de soma não nula, baseado na teoria dos jogos) está disponível em um site em que o posicionamento do autor é apresentado. Ou seja, podemos debater o argumento, questionar os efeitos do jogo, gerar um debate a partir disso, tal como fazemos com demais artefatos culturais. Não precisamos concordar com o autor (mas somos levados a argumentar para defender nosso ponto de vista, caso isso ocorra).
Assim, o jogo não possui a armadilha encontrada em "blockbusters" como Civilization ou The Sims, que se assumem como "entretenimentos neutros", disseminam-se como "universais" (todas as nações buscam um mesmo objetivo; todas as famílias são alfabetizadas e proprietárias de imóveis) e generalizam noções, sobre os assuntos que abordam, que são locais.
8 comentários:
Henrique,
Fiquei surpreso mesmo com seu post. Foi um belo presente. Muito obrigado. Acho que a narrativa foi muito útil.
Eu reconheço que eu deveria escrever um artigo explicando esse jogo, como Jeffrey Ventrella, biólogo e autor de um ótimo jogo de simulação, o Genepool, fez. Mas com certeza este seu post me incentiva a fazê-lo o mais breve possível.
Eu posso contar a história da concepção desse jogo de forma resumida: Começou quando resenhei a tese de Mark S. Meritt (http://potluckcreativearts.com/) sobre Insustentabilidade e origens do crescimento econômico (http://umanovacultura.blogspot.com/2007/08/mudando-o-paradigma-econmico.html), uma tese de mestrado em estudos liberais que estava baseada num romancista que eu gostava na época, o Daniel Quinn, mas do qual já me afastei.
Li um artigo de Meritt sobre teoria dos jogos, e estudando o dilema do prisioneiro, me propus a criar uma simulação que TESTASSE a teoria, como de fato havia sido feito. Então fiz um aplicativo chamado simplesmente Dilema (que eu chamei de jogo de estratégia), e me surpreendi em comprovar por meio dele a teoria de Robert Axelrod.
Depois veio a idéia de fazer o Sim Dilema, e ver se a teoria continuava verdadeira quando há mais de dois jogadores. Mas as coisas realmente ficaram um pouco diferentes. Os 400 dias é uma quantidade escolhida arbitrariamente que significa apenas um longo tempo. Sobre o consumo diário de recursos, é realmente um "tweak" que não está em teoria alguma, pois na vida real o consumo individual tende a aumentar quando há muitos recursos disponíveis, e eu adicionei essa interferência na “matemática pura” da teoria dos jogos, incluindo essa variável interpretada. Acontece que, sem essa variável, a simulação tende a se afastar ainda mais da realidade. Este seria um ajuste de “arredondamento” que diminui um pouco a incompatibilidade entre modelo reducionista e realidade.
A recomendação de modificar o mínimo possível é como uma seleção de nível de dificuldade. Quanto menos se modifica, mas difícil a solução, por isso mais valiosa.
Por fim, muito obrigado pela análise muito bem vinda. Não sei se Sim Dilema realmente alcança o que eu me propus, mas é pelo menos uma tentativa nesse sentido.
Quanto ao fato de ser divertido, eu confesso, meu conceito de diversão é ficar em casa lendo e escrevendo. Quanto ao mercado, infelizmente, ele vai continuar sendo expressivo, por meio de tantos que emprestam suas vozes a ele, e é bom saber que pelo menos algumas pessoas têm uma postura mais crítica.
Abraço
Janos
Bem, talvez os poucos comentários sobre o jogo seja por ele ser intimidador! Então dá medo de falar Besteira! :P.
Particularmente eu dependi muito da Narrativa do Henrique sobre a Marisa pra gerar algum sentido, e mesmo ele não me ajudou muito a jogá-lo.
Então lá vou eu, correr o risco de falar besteira:
O Fato é que fui muito ruim, e não tive noção alguma de como formular alguma estratégia. Me senti jogando arbitrariamente por não ter noção do que fazer.
Obviamente com isso vários morriam antes mesmo de 80 dias, pra minha grande frustação.
Limito-me a relatar essa sensação. Se tenta-se analisar ou julgar com certeza usaria dos tais filtros culturais Mencionados no post Seguinte, ou seja, seria algo sem um real entendimento da proposta do trabalho.
Talvez o ruído esteja na mente do Jogador aqui mesmo.
Adoro acompanhar vocês, Janos e Henrique trocando figurinhas em certos assuntos. Parece haver empatia entre ambos. Possuem os dois Blogs que mais visito (embora não sei porque comente mais nesse).
Mas minha cabeça é, digamos, a de um artista. que é uma modalidade de pensador, mas difere de um filósofo, intelectual ou algo do tipo (embora traga semelhanças por alguma busca interior de sentidos).
Mas como artista posso tentar pensar em questões como "intenção ou propósta da Obra". Posso não ter entrado no clima do que se propõe, mas queria saber do Janos se ele considera essa obra como uma tentativa pessoal de fazer um "Game arte", ou se esse rótulo é totalmente irrelevante? Ou ainda, se não como Game art, mas um Jogo Crítico, a intenção estaria mais centrada na mensagem a ser passada ou nas questões levantadas?
Nesse segundo caso, não acha que algumas questões de jogo )jagabilidade, Gameplay etc.) ajudariam na eficácia do que teoricamente é importante (considerando que seja a mensagem e questões levandas)?
Falo isso porque o objetivo do jogo está colocado claramente. As variáveis possiveis de se alterar também. Por´me no momento que joguei, fiquei perdidão. Isso faz parte? Essa sensação de perdido pode fazer parte do que se espera da obra...
Pensa em fazer adaptações?
Considera importante o Ambiente relativamente "Abstrato" ou "irrelevante" (no caso, um gramado vazio em que personagens aparecem com roupas típicas de RPG)? Foi falta de opção?
Não estou exatamente criticando ou julgando. Apenas levantando questões que me chamam atenção de imediato. Por considerar uma Boa Próposta e um tema relevante e uma mecância teoricamente interessante (Confesso que é uma visão influenciada pelos filtros culturais que Henrique Alerta no Pest seguinte) acredito que, se fosse de sua intenção, detalhes poderiam ser revisados e revisitados para aumentar a eficácia da propósta (SE FOR A PROPOSTA, claro).
Enfatizo a palavra "proposta" porque é nela que se baseia tudo. Considero o norte do que se faz. você, Janos, coloca que "Não sei se Sim Dilema realmente alcança o que eu me propus, mas é pelo menos uma tentativa nesse sentido"
Como Grande admirador de seus textos adoraria que conseguisse realizar sua proposta também em uma OBRA. Não se trata de torna-lo mais divertido ou esses critérios. Enfim, tô começando a me repetir!
Caso seja de seu interesse posso até trabalhar em gráficos mais condizentes com o que propõe (caso esses usados tenham sido falta de opção). Pixel arte é minh aliguagem, poderia ajudar-te rapidamente. E espero ter sido claro no que tentei dizer: Sobre a OBRA ter atingido SUAS espectativas. E também sobre ela ter maior aceitação (não uma aceitação em larga escala, mas o Henrique falou que ela quase não foi comentada). SE a intenção é comunicação de mensagem, não custa ser atrativa (poxa, parece um marqueteiro falando). Tudo que falei vai por aguá abaixo simplesmente se disser que suas intenções pareceram supridas com a Obra como tal.
Enfim, é a sensação de obra incompleta que poderia se completar. E que merece isso!
Olá, Onofre!
Não acho que você sabe disso, mas sou (ou pretendo ser) muito mais que um "rostinho intelectual na TV". Também tenho olhar de artista (estou com um livro de contos buscando editora e uma novela em processo de revisão) e, aliás, minha grande busca no momento é tentar compreender como conciliar game e produção artística.
Além disso, tenho alguns projetos de GameArte que não saíram do papel ainda por minha absoluta incompetência em programar ou em convencer programadores. Mas tenho um jogo de cartas que fiz e pretendo divulgar.
Também acho que o Janos não se resume como filósofo. O site dele "antizero.rg3,net" possui (ou possuía) alguns contos.
Acho que o jogo do Janos é algo realmente difícil e, por ser denso, tem um público muito mais limitado do que o de um game casual. O que dificulta, ao meu ver, é que o jogo praticamente "testa" a teoria em questão. Sendo assim, é necessário compreender o que geraria "recursos" e o que geraria "escassez" antes de jogar. O jogo não acaba fazendo essa ponte, pelo menos não em um nível mais básico.
Minha opinião (já que vocês estão discutindo no meu blog, sinto-me em casa para palpitar, rs) é que o jogo teria a ganhar com uma outra interface. Estamos numa época bastante visual, e acredito que o público poderia usufruir de pistas visuais para entrar no universo do jogo. Sei que o Janos gosta da estética dos primeiros jogos de computador e dos "rogue-like", mas, ao meu ver, são estéticas datadas e muito difíceis de serem entendidas por gerações mais novas.
Lógico que, daí para diante, vai da posição do Janos.
Eu até pensei em sugerir que os desafios viessem em "fases", além de possibilitar o sistema sandbox. Em termos de jogabilidade, fases em que o sucesso é maior no início, até o jogador pegar o jeito, costumam estimular. Não sei também se isso foge ao propósito ou mesmo se é possível fazer isso a partir dos conhecimentos de programação que o Janos possui. Mas já que estamos comentando o jogo, ficam os palpites.
Bom, fico feliz que meu comentário tenha gerado esse diálogo. Aliás, espero que possamos realizar, também, parcerias futuras na produção de jogos.
Abraço!
Olá Onofre,
Eu tenho noção disso tudo que você está falando. Se um dia você conversar comigo pessoalmente, você vai perceber que eu sou um cara chato, pareço um velho de 89 anos. Não combino com essa juventude que às vezes é mais velha que eu. Minha percepção de mundo é diferente.
Mas, para ser direto, Sim Dilema não é artístico, é autístico, é um jogo feito mais para mim do que para os outros. Eu o disponibilizei caso alguém encontre também uma utilidade para ele, e não para divertir ou entreter. Ele é muito mais um aplicativo, do tipo uma calculadora científica das ciências sociais.
Então, não é que eu não gostaria de fazer isso de forma mais atrativa para o grande público, ou em forma de jogo jogo mesmo, que é uma ótima idéia, mas eu simplesmente não saberia por onde começar. Sim, é isso aí, eu resenho jogos artísticos mas eu mesmo não tenho o dom de fazê-los. Mas tudo bem, porque alguns dos grandes comentadores de arte foram péssimos artistas.
Na verdade, só comecei a chamar isso de jogo recentemente. A idéia original é criar algo como um Gene Pool com humanos. Eu já comecei a programação de um que seria chamado Meme Pool (um meme é uma unidade de cultura). Nesse meme pool não teria oito jogadores, mas potencialmente milhares, cada um deles uma IA com uma programação/comportamento para sobrevivência/agressividade, e a diferença é que eles não transmitem sua programação por reprodução sexual, mas por interação social.
E, sim, só usei esses gráficos por falta de opção, mas de início nem esse tipo de gráficos haveria, as pessoas seriam bolinhas coloridas. A interface seria ainda mais confusa, sem nenhuma explicação, quero dizer que, de certa forma, essa monstruosidade aí é resultado de certo esforço na tentativa de fazer algo um pouco mais palatável, porém esse nunca foi meu objetivo.
Eu sempre escrevi poesias e contos, mas eles são absolutamente obscuros e enigmáticos. Meu tipo de arte está condenado a nunca ganhar notoriedade, mas eu considero isso uma coisa boa, porque não gosto de notoriedade, e nem sequer gosto de facilitar demais a comunicação (em certas circunstâncias), porque considero que se a maioria não consegue entender, então a coisa ficou boa. Huahuahua. É claro que isso pode ser puro obscurantismo meu. Então estou aberto a reavaliar a interface, caso alguém tenha alguma idéia e algum interesse em tornar essa obra mais acessível. E, respondendo ao Henrique, eu teria condições sim de programar em fases, como outros puzzlers, Karoshi por exemplo, mas isso nunca nem tinha me passado pela cabeça.
Sobre ser um jogo crítico, isto é, que visa passar uma mensagem crítica da sociedade, não é bem isso também. Embora funcione assim, de certa forma, porque é uma simulação do tipo que você tem que ficar observando sem fazer nada pela maior parte do tempo, e isso é muito sacrifício para alguém de uma sociedade da ação e dos resultados imediatos.
O que o jogo ensina não é minha visão de mundo. O que ele diz em resumo é que a teoria dos jogos diz que a cooperação é uma variável evolutiva necessária para sobrevivência. Isso é até anti-ético, de certo ponto de vista, porque muitos podem interpretar isso como uma origem mecânica do altruísmo, ou um determinismo biológico ou uma redução das regras sociais às leis da ciência natural. Enfim, o jogo não diz o que eu tenho a dizer sobre a sociedade. Ele não passa de uma calculadora mesmo, que serve para testar certas teorias bastante restritas, e exige muita interpretação para resultar num conhecimento interessante.
Não foi minha intenção resumi-los! tenho noção da riqueza interior de cada um que o tornam maiores que qualquer rótulo! Talvez ressaltar um aspecto que mais destaque. Me denomino Artista porque de fato, fortemente e inevitávelmente vejo a vida com os olhos de alguém que encontra sentido no fazer, no formar através de elementos. Isso tem um peso grande em minha vida e na forma de compreender! É existencial! Não me chamo de Artista por ser desenhista ou por trabalhar no ramo, ou estudar o assunto, mas por achar que eu preciso FAZER coisas pra encontrar o sentido de viver. Assim como também considero valioso apreciar com mais cuidado o fazer de outro alguém, e tentar compreender porque foi feito daquele jeito e não de outro. Há muito de quem fez nisso!
Espero ter sido claro no quão respeito a Bússola interna do "Criador" (pra não repertir o termo artista), por isso quis compreender se eu poderia usar essa obra como referência, no sentido dela ser o que o Janos queria que fosse.
Se a obra está tal qual você quis então ela é uma ponte mais precisa para sua interioridade.
As bolinhas talvez tivessem sido mais condizentes do que os bonequinhos (cujas roupas remetiam a algo alheio ao jogo. Não eram neutros. "falavam"). Não tem nada haver com o estilo gráfico de determinada geração (até porque nisso eu me indentifico mais com gráficos pixelados do que com ultra-realistas)!
Posso estar me apegando demais a minha Linguagem (visual), justamente por ela falar imediatamente a mim. E acabou falando eloquentemente um ponto verdadeiro: Que essa questão não lhe era importante. Como bem falou "nunca foi sua intenção" fazer algo palatável!
Mas não tá uma monstruosidade!
É uma questão de sentido, não de estética!
Você tocou agora num ponto que também me afeta bastante! A questão do "Incompreendido".
Podemos não Buscar notoriedade, mas compreensão parece ser uma necessidade humana! Creio que no fundo, ao sairmos escrevendo tantas coisas pelaí, tenhamos alguma intenção de ser entendido por alguém em algum lugar. O Artista que diz fazer pra si é o que mais fala sobre si! E consientemente ou não aquilo saiu dele numa tentativa de criar um elo com o mundo exterior e possivelmente comunicar (tornar comum a...).
E para mim a Arte surge quando as palavras (em prosa linear) já não bastam, porque o que se quer dizer é amplo e profundo demais. Agrupar palavras também é uma Arte (que sempre me escapa, nunca se vai tudo o que quero dizer).
Eu sou GRay! Lembrando o Brilhante jogo comentando brilhantemente em seu Blog, Janos. Muitas vezes me sinto realmente como o Bonequinho dele por não estar radicalmente em um dos lados.
Meu trabalho é muito Palatável. O preço disso é uns 99% o julgarão muito superficialmente (mesmo gostando). Uns acharão bonito! Outros apreciarão a técnica! Outros tentarão questionar a originalidade, me chamando conservador. Devido nossa era tão visual, As imagens também são vistas pro filtros muito rápidos e critérios cheios de convenções. Por ser imagem, é visto como aparência! E A aparência bonita que faço, dificulta a visão da essência! Quem vislumbra essência num segundo, odeia aparências no Outro. Porém a beleza externa que faço tem uma razão de ser que não me cabe explicar agora, mas vai um vídeo da Fayga de onte tiro uma frase: "A beleza não é o bonitinho. É a própria verdade interior, a justeza interior...":
http://www.youtube.com/watch?v=iM2woc1Vt3s
Aqui tem o contexto da frase!
Algumas obras me fazem sentir-se compreendido (Gray, um Exemplo), mais do que alguns textos ou conversas! Só que algumas obras "comerciais" também me trazem esse sentimento de compreensão (como o Incompreendido e cruxificado KOF XII).
Tentarei jogar Dilema com mais calma. Posso apreciar ação mas não necessariamente "Resultados imediatos". Senão não construiria imagens ponto a ponto!
Onofre,
Você está coberto de razão. Agora que te conheço melhor, posso dizer que entendi melhor o que você estava dizendo, e concordo. Afinal, estética também é uma área da filosofia.
Já tinha planejado fazer o "Meme Pool" com bolinhas. Se eu fizer, peço sua ajuda. Valeu!
Abraço
Janos
Aliás, outro dia vi um game designer que só usa bolinhas, e os jogos são ótimos. http://nmccoy.net/
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