segunda-feira, 14 de abril de 2008

Jogos críticos x Jogos bons

No almoço que antecedeu a defesa de meu mestrado, em fevereiro, deu-se uma cena que ficou gravada em minha memória. Estávamos, eu e familiares, num restaurante vegetariano, alternativo, ou algo assim. Daqueles que não tem carne, mas que tem bastante fritura e tempero, com uma leve pitada de culiária oriental.

Pois bem, minha mãe experimenta uma torta de batatas e carne de soja. Logo que vou pegar meu segundo prato, pergunto qual o gosto dessa torta, para ver se compensa eu comê-la. Ao que responde minha mãe:

- Ah, é boa. Levando em conta que é de soja, está gostosa.

***

Essa pequena anedota ilustra um certo posicionamento que, julgo, deve ser a todo custo evitado ao se avaliar algum produto ou artefato. Algo como agregar, de antemão, um valor a mais a um filme mediano por conta dele "ser baseado em fatos reais". E daí? É um filme, ainda, e deve ser analisado como tal.

Temo muito, dentro dessa tentativa de divulgar, exaltar, defender a criação de jogos sérios e, principalmente, de jogos críticos, que se tenha uma certa "clemência" por jogos com "boas intenções", mas que, por um motivo ou outro, fiquem muito aquém do que um jogador pode esperar de um jogo. Externo essa minha preocupação, latente há muito tempo, por conta de uma análise particular do jogo "Deliver the Net" e também pela análise sobre esse mesmo jogo realizada por Ian Bogost no site Water Cooler Games.


O visual, como bem disse Bogost, é atraente e chama a atenção, mas é desperdiçado num jogo em que impera uma lack of depth as a simulated experience (BOGOST). O autor ainda ressalta muito bem que, do modo que foi construído, Deliver the Net acaba mais possuindo um perfil mais de um veículo complexo de divulgação do que um jogo.

Em poucos segundos de interação, isso já pode ser percebido. O objetivo é entregar redes para as famílias em cabanas em um ambiente desértico africano. Para isso, não há desafios ou dificuldades, não há alguma tensão (nem uma mínima, por exemplo, de o protagonista "cair da moto"). A velocidade com que a moto pode andar é sempre a mesma, sempre lenta. Os obstáculos a serem desviados são poucos e fáceis. Não há como não cumprir o objetivo, a menos que se canse do jogo antes (o que é uma grande propaganda contra o próprio site).

Podem espernear, falar de baixos orçamentos, de complicações. Mas exemplos de jogos casuais que têm explodido com sucesso em Kongregates da vida mostram que o buraco é bem mais embaixo. Se há gente boa para fazer um "Fancy Pants", ou similares e colocar na rede, é de se constatar que gente boa existe para fazer coisas legais nessa linha. Por outro lado, há poucas coisas que vêm surgindo que sejam realmente boas e que fujam do par "Persuasive Games" e "Molleindustria".

É de se continuar incentivando esse caminho, que é muito promissor, mas que vem sendo constituído, em grande parte, por tortas de batata com soja.

Em tempo: percebam que, neste post, estou sendo até muito mais básico e superficial do que o Bogost, embora endosse sua opinião. Ele reclama que o jogo não tem profundidade. Eu, dessa vez, só queria que o jogo fosse legal.

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