quinta-feira, 25 de dezembro de 2008

Quando os meios justificam os meios

Sabe-se que uma meta padrão de um jogo é ser divertido pelo máximo de tempo possível. Aliás, esse é um forte componente de avaliação do sucesso ou do insucesso de um videogame - mais que sua capacidade de entreter, sua capacidade de permanecer entretendo. Uma saída que os designers encontraram para isso (e eu não sei qual o primeiro jogo que teve esse tipo de "estímulo externo") foi começar a colocar sub-missões e metas menores em paralelo ao caminho (muitas vezes "linear") do jogo. De modo mais tênue, é aquela recompensa pela pontuação (pensando em Fire Shark ou jogos em que você pode deixar os inimigos sem matá-los). Também há as argolas de Sonic, que levam às esmeraldas. Ou os personagens secretos de jogos estilo SF2.

Em jogos casuais, até porque a meta central do jogo é, por definição, de curta duração, esses objetivos secundários são muito utilizados, tendo como recompensa apenas o reconhecimento (muitas vezes público) de que você o atingiu. É algo que funciona bem quando os jogos são parte de um ambiente compartilhado por demais usuários. No site Kongregate, por exemplo, é desse modo que se consegue "requentar" os jogos, valorizando-os por mais tempo: vincula-se os "achievements" a uma espécie de "quadro de medalhas" do usuário, em que ele ganha "badges" e aumenta sua pontuação geral. É um tipo de desafio, colocado como secundário, que valoriza a jogabilidade, pois leva o jogador a seguir novas trajetórias, alcançar novos feitos.

Mas e quando o secundário emerge como primário, central, fundamental? É o deslocamento proposto por "Achievement Unlocked", que coloca em evidência a "espessura" histórica e cultural do jogo como um gênero e uma prática social. Nesse jogo, o "objetivo central" consiste justamente em cumprir os desafios que normalmente se apresentam como secundários. Aliás, o jogo, mais que isso, subverte até essa noção de "desafio", que exige destreza e raciocínio lógico avançado do jogador, ao premiar o jogador por ele "ir à direita", "ir à esquerda", "ficar parado" ou "morrer 100 vezes".



O primeiro "achievement", aliás, começa antes do "jogo", quando o jogador consegue "carregar o jogo" e "achar a tela do patrocinador". Isso nos leva necessariamente a pensar, por exemplo (e essa discussão já existe, por exemplo, quando se fala de livro, texto e literatura), no que consiste o jogo em si: apenas a parte posterior ao menu e antes dos créditos? Todo o arquivo executável em flash? O entorno do jogo (o site que o hospeda, por exemplo)? O tamanho do monitor, o teclado, o joystick, a cadeira utilizada pelo jogador? Essa discussão, inclusive, já foi esboçada nesse blog, certa vez, ao discutir o jogo Karoshi 2.0.

Mas não se pára por aí. A proposta, ao mesmo tempo simples, mas teoricamente densa, pode trazer à tona inumeráveis discussões sobre metagame, narrativa, o propósito de um jogo, jogo como cultura, entre outros tópicos. Coisas que vão muito além de um simples post...


sábado, 6 de dezembro de 2008

Link para a Dissertação: ativo novamente

Segundo o Roger Tavares, da Game Cultura, o link havia ficado momentaneamente fora do ar por uma sobrecarga de usuários.

Bem, está ativo novamente.

Agradeço à Game Cultura pela opção de disponibilizar arquivos para serem compartilhados e ao Roger pela preocupação em avisar sobre o ocorrido. É muita gentileza! ;)

Abraço a todos e boa leitura!

EDIT: algumas pessoas ainda estão tendo problemas com o site da GameCultura. Caso isso ocorra, podem pedir por o arquvo por e-mail. Talvez eu não responda de imediato, mas certamente responderei!

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

The Free Culture Game - Um segundo olhar

Para quem se interessou pelo jogo e/ou pelo post anterior e/ou se interessa pela diversidade de opinião sobre um mesmo assunto, vale a pena entrar no review feito no Infoblarg sobre esse mesmo jogo, clicando aqui. Discute mais o jogo em si e explica melhor questões que o envolvem, como o que seria o copyleft, por exemplo.

No site em questão ainda há um redirecionamento para quem quer se aprofundar na discussão sobre direitos autorais. Para ler sobre o assunto, clique aqui.

sábado, 29 de novembro de 2008

The Free Culture Game - Um manifesto metalingüístico?

Um dos trabalhos mais impactantes (embora não tão difundido) no mundo dos games nos últimos tempo, em minha opinião, é o recente jogo da Molleindustria, "The Free Culture Game ". Na página que o hospeda, o jogo é entendido como uma "teoria jogável". É uma alcunha interessante, que brinca até com epistemologias. Como uma teoria pode ser algo "jogável"? Como novas mídias podem ocupar espaços que antes eram exclusivos do meio impresso? Alguém aceitaria um jogo desses como monografia de fim de curso em uma área de humanas? Cadê tudo que é necessário para uma teoria passar a ter validade na sociedade: fundamentação teórica, justificativa, metodologia, etc? Ou seja, essa provocação, por si só, já vale para questionarmos nossas atuais epistemologias. É possível para todo o sempre ficarmos falando sobre novas tecnologias do mesmo modo engessado que construímos ciência até hoje? As mudanças devem ocorrer quando e em quê?

Deixando essa discussão em aberto para debate (afinal, não serei eu a dar respostas para isso), apresento a minha interpretação sobre o jogo, defendendo os motivos que me levaram a considerá-la.

Penso no jogo em questão como um "Manifesto metalingüístico". Para mim, a teoria não está sendo feita ali, no jogo, mas ela é prévia ao jogo. A teoria estava na cabeça de quem construiu o jogo, por assim dizer. O jogo é um instrumento para apresentar a teoria (que está contido no movimento da Cultura Livre), convencer o interlocutor (e jogador) a respeito dela e mobilizá-lo a nortear suas ações segundo a lógica apresentada. Ora, isso são caraterísticas típicas de um manifesto.

Primeiro, pode-se partir do próprio título que, como é comum, anuncia seu intento. O jogo da "cultura livre" apregoa justamente a favor de uma cultura que não esteja subordinada às corporações e ao copyright, para se poder promover a reflexão e a troca de idéias dentro de uma sociedade.

Em segundo, nota-se o caráter persuasivo contido no jogo. Bem, o foco de uma teoria é na informação. Aqui, há um foco (que é próprio de jogos, aliás) no receptor. Apesar da apresentação inicial de conceitos, o que o jogador irá fazer, de fato, é se mobilizar para agir de acordo com o que está sendo defendido: compartilhar conhecimento em prol da cultura e em detrimento da indústria cultural, que massifica e encaixota os olhares sobre o mundo. Não está apenas sendo dito que isso ocorre, está se convocando o jogador a "militar" nessa tarefa contra a indústria cultural.

Outra característica do manifesto: o problema em questão é identificado (o modo com a indústria cultural opera em nossa sociedade) e as conseqüências disso são analisadas. Mas não se pára por aí. O jogo convoca o jogador não a uma reflexão "ampla" sobre os vários pontos de vista sobre o assunto, mas o conduz a acreditar e reproduzir aquele que está sendo apresentado. Com isso, o jogo tenta angariar "militantes" para o seu fim: driblar a indústria cultural por meio do Creative Commons.

E em que medida isso é relevante? Bem, quando pensamos em um manifesto impresso, o que se tem não são mais que projeções apresentadas pelo autor (sendo ele uma pessoa ou um grupo). O interlocutor tem que acatar previamente aquela "verdade", pôr em prática por "fé" e só então, depois de agir conforme pedido, comprovar se as previsões e os acontecimentos bateram.

Há uma significativa mudança discursiva quando se pensa em uma persuasão baseada em código-fonte. O jogador não apenas lê e interpreta algo que está previamente rígido, fixo. Exige-se dele ESCOLHAS, e são essas escolhas que vão direcionar o que é apresentado em tela. Ou seja, o jogador é convocado à ação. Tê-lo agindo (embora de uma maneira conceitual e abstrata, obviamente, já que ele não está modificando estruturas sociais a partir da experiência com o jogo) parece ser um modo eficaz de criar em seu pensar a idéia de que AQUELA AÇÃO É POSSÍVEL, de que aquilo que ele experienciou no ciberespaço pode se realizar na prática.

É um recurso a ser (muito bem) pensado e desenvolvido por criadores de jogos e pessoas da área interessadas em promover reflexão crítica. Cria-se um mundo novo, um conjunto de possibilidades novas. A partir de jogos e simulações, por exemplo, é possível desenvolver uma sociedade anarquista, uma sociedade coletora, uma sociedade comunista, uma sociedade pós-apocalíptica e, a partir dessas experiências, evidenciar que os nossos arranjos sociais atuais não são os únicos possíveis. Afinal, os jogos atuais, ao se repetirem e repetirem valores vigentes não estão sendo apenas pouco criativos. Estão contribuindo para a reprodução das idéias de que o russo é mafioso, a América Latina é um antro de corrupção, o expansionismo é A ferramenta para o sucesso de uma nação, a economia é baseada na troca de recursos ilimitados, a cultura só pode ser adquirida por meio do consumo e da compra, o...




domingo, 23 de novembro de 2008

Link para a Dissertação: fora do ar :(

Bom, alguém pode ter notado que o link para minha dissertação, no site Gamecultura, está, por algum motivo, fora do ar.

O problema certamente será resolvido. Provavelmente, em breve. Se alguém quiser, nesse meio tempo, uma cópia de meu trabalho, basta me pedir por e-mail.

Abraço a todos os poucos visitantes... ;)

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Jogos digitais x Meio ambiente

Hoje eu assisti ao documentário "A história das coisas".

Fiquei pensando em maneiras como a prática de jogar se relaciona com o consumismo e com todos os problemas que o circundam.

De um lado, os grandes jogos, que exigem grandes equipes, grandes indústrias já produzem, em sua fabricação um gasto considerável de recursos - desde energia, folhas de papel, cds, dvds, passando pelo "china in box" (com todos seus garfinhos de plásticos, molhos prontos, isopor térmico, etc) que o funcionário, por não ter tempo disponível para outro tipo de refeição, acaba consumindo.

Mas talvez essa seja a parte menos assustadora. Dentre os usos não especializados de um computador (penso em arquitetos, por exemplo, ou laboratórios que precisam de processadores rápidos para diferentes tipos de simulação), certamente os jogos são aqueles que mais exigem da máquina. É o processador, é a placa de vídeo, a memória, o espaço. Os jogos novos, baladados, alardeados como as principais novidades do mercado, via de regra, são os jogos que exigem mais recursos e que deixam seu computador obsoleto mais rapidamente.

Eu queria jogar, por exemplo, Fallout 3. Adoro a série, tenho uma fixação pelo sarcasmo, pelo pós-apocalíptico, etc. etc. Mas meu processador não agüentaria o jogo. E ele nem é o mais avançado dos jogos.

Fico pensando quantos milhões de adolescentes não trocam (leia-se: pedem para os pais trocarem) pelo menos uma vez ao ano o maquinário de seus computadores para poder jogar mais um jogo de FPS (só que mais realista!) ou mais outro RTS (só que com mais recursos) que não apresentam mudanças, a não ser na perfumaria, frente a um Doom ou a um Dune 2.

Por isso, continuar na marcha pró-engenhosidade, priorizando o que faz do videogame um jogo - ou seja, sua estrutura lúdica, seu conjunto de regras, valores, interações - e colocando em segundo plano as "aparências" é mais que valorizar o bom profissional. É mais que favorecer reflexão crítica, desenvolver a imaginação, ampliar o arcabouço discursivo do jogador.

É cuidar do meio ambiente.

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Dissertação de Mestrado!

Bem... apesar de eu ter terminado a dissertação em fevereiro, problemas na gráfica alongaram o período de homologação para além do previsto. Logo que a homologação foi confirmada, eu é que fiquei sem tempo.

Mas agora está aí, disponível para download.

Segue o link

Façam bom proveito, discutam, critiquem, questionem... é um primeiro passo na área, que carece (e muito) de teoria. Ficaria feliz em saber que essas discussões iniciais estão sendo lidas, mesmo que para alguém propor totalmente o oposto. ;)

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

Linha evolutiva: do 2D ao 3D ao... 1D?

Esse é um Blog notadamente focado no conteúdo dos jogos. Ou seja: em sua parte discursiva, suas relações com a(s) sociedade(s) e os aspectos culturais que representam. De qualquer maneira, porém, é algo empobrecedor estabelecer dicotomia entre forma e conteúdo, como se apenas um aspecto entre ambos meceresse ser destacado ou, pior, como se somente jogos notadamente "anti-hegemônicos" em relação à estrutura social fossem dignos de avaliação.

Lembro-me de um dia o Bosi, na UNICAMP, comentando sobre literatura e uma das grandes discordâncias como o pessoal da crítica literária em geral - o de julgar a obra pelo conteúdo marxista que ela tinha. Usou, o autor, de uma expressão irônica: ele não avaliaria literatura com um marxômetro do lado.

O bla-bla-blá inicial serve de gancho para sair um pouco das narrativas e dos aspectos discursivos e discutir um jogo que chama atenção pelo aspecto formal: o Z-Rox.

Por tempos, jogando nossos plataformas da vida, sonhávamos com novas tecnologias que proporcionassem um 3D cada vez mais "realista". Hoje a computação gráfica tem provado que romper esses limites é só questão de tempo e de investimento maciço de grana. Cansados de se maravilhar com isso, podemos aplaudir a inciativa do "Evil Dog", autor do Z-Rox. Afinal, ele construiu um jogo que sabiamente vai na contramão do que a tecnologia proporciona e mostra algo em falta nos jogos em voga: criatividade e autoria.

Z-Rox é o resultado de uma espécie de um "desafio" que seu produtor fez a si mesmo: elaborar um jogo com apenas uma dimensão. Isso mesmo. A lógica do jogo é simples (mas adequada, dado que, dentro dos limites, Evil Dog consegue cumprir sua proposta): uma forma passa de cima para baixo na dimensão de uma linha, e o jogador tem que adivinhar a que ela corresponde. O exemplo abaixo, do tutorial do jogo, mostra o T passando (evidenciando em tom mais fraco o que, no jogo - como é visto na segunda imagem, estaria oculto).




A rigor, chega a ser contestável que esse jogo é feito em apenas uma dimensão. Obviamente, o mínimo de espessura que tem a linha já lhe dá uma segunda dimensão. Mas isso não invalida, de modo algum, o efeito "1D" a que o jogo se propõe (até porque, a rigor, os jogos 3d também não possui senão uma ilusão de terceira dimensão). Aliás, é interessante o fato de o jogo, tendo sucesso em suas pretensões, ainda assim ser divertido e desafiador (embora não ache que teria um grande público interessado).

Mais que isso, é louvável ver que pessoas ainda tentam subverter as convenções dos jogos - seja na forma ou no conteúdo - não ficando presas ao que "grandes correntes" mercadológicas poderiam ditar. O esforço criativo em desconstruir a forma do jogo é extremamente útil, pois traz aos gamers novas possibilidades de desenvolver seus projetos, novos campos e soluções a serem explorados. Isso tem a ver com o que foi falado no post anterior, sobre a "instituição da cultura gamer". É um campo fértil e dinâmico justamente porque temos gente que se dispõe a testar e apresentar arranjos que não foram ainda pensados.

Enquanto, muitas vezes, o mercado vai se repetindo e se "renovando" com as manjadas fórmulas de Dooms, Dune 2s, Tomb Raiders, Day of The Tentacles, entre outros, certas criações e certos produtores ainda podem experimentar e buscar novos rumos. E falhar, falhar... muitas vezes. O que importa? Criar é (ou deveria ser) isso. E não empacotar à exaustão idéias batidas condimentadas com lasquinhas de novidades. Aliás, isso já dá assunto sobre um outro post e um outro jogo: The Free Culture Game. Mas não agora.

sábado, 27 de setembro de 2008

A instituição da cultura gamer II: exemplos e apontamentos.

Depois de um longo hiato com relação ao primeiro post sobre esse assunto, tento retomar a idéia.

Parece que o universo gamer permite-se emancipado (perante ele e perante as mídias parelhas) quanto mais assume como próprios certos temas e, mais que isso, cria uma regularidade que possibilita, inclusive, subversões internas, desconstruções da própria lógica prevista nos jogos. Em outras palavras, quando o óbvio aparece no jogar e, principalmente, quando o óbvio começa a ser desconstruído, vê-se que o jogo já tem parâmetros e lógicas próprias. Nisso está o sentido de jogos como o Karoshi ou os jogos IWBTG e The Unfair Platformer.

No Brasil, embora não haja uma sistematização (seja teórica, seja do ponto de vista da produção) de jogos que vão nessa linha, ainda conseguimos encontrar alguns exemplos. Janos Biro, por exemplo, parte de lógicas compartilhadas pelos gamers para criar subversivo "Diacho". Em um jogo bastante simples (e que, à primeira vista, poderia passar como apenas mais uma tentativa de expressão por meio do jogo), vê-se uma sátira ao jogo Diablo (e, com isso, aos RPGs em geral) e um "detóurnement", ou seja, um deslocamento de sentido do que era para ser um RPG em tais circunstâncias. A simplicidade do próprio jogo é satirizada pelo autor e é incorporada como elemento do jogo quando, ao apresentá-lo, Janos convida o jogador a explorar "o mundo de Diacho" e descobrir "porque ele tem gráficos tão ruins!".

O (já citado, no post anterior) trabalho de Roger Tavares e Felipe Neves, "Realidades Alternativas", também podem explicitar esse processo de naturalização da lógica do jogo e, mais, de uma tentativa de desnaturalização a partir das convenções já estabelecidas dos gêneros de "1st person shooter". Os autores promovem 3 modificações no difundido Counter Strike de modo a retrabalhar o conceito de "realidade" dentro do universo gamer. Na primeira, a "SinCity", os autores aproximam a esfera do jogo a uma esfera de quadrinhos, estilizada com traços marcadamente divergentes a uma estética realista. No segundo, "Blind", altera-se a iluminação do jogo, promovendo uma outra esfera, completamente diferente e não prevista. Ora, sabe-se que o jogo de luz e sombra de um jogo nesse estilo cria a esfera considerada "adequada" pelos produtores e conduz o jogador aos momentos que seriam de maior ou menor tensão. Ao suberver essa lógica, evidencia que mesmo a imersão que o jogador tem em um jogo (e os sentimentos dela advindos) não passa de construtos calcados em convenções.

A terceira (e a mais divertida, imagino) é a subversão de um dos pilares de um jogo: o som. Raríssimos são os jogos (excetuando-se o mundo dos casual games, talvez) em que o som não exerça papel fundamental. Creio que apenas os "managers" de maneira geral tem o som como "acréscimo" ao jogo, e não como elemento que oferece pistas e respostas ao jogador. Ao trocarem todas as comunicações por sons aleatórios, os autores despertam a ênfase em outras habilidades, além de evidenciar que a natureza multimodal dos jogos (integração de várias modalidades na construção de sentido) é a base de sua construção. São esses três casos em que a idéia de que um jogo possa ser transparente é completamente minada, o que reforça a idéia dessa instituição de uma cultura gamer, em que as convenções se tornam cada vez mais próprias e específicas do meio.

Podemos ir além. Qualquer pessoa que dedique um tempo de sua vida aos jogos pode se deparar como o jogo "Revenge of the Stickmen" e entender sua brincadeira, sua ironia quando assume, como história de fundo, a seguinte narrativa:



Bem, logicamente os "bonecos-palito" não foram criados no mundo dos jogos. Porém, nesse universo eles ganham uma relativa importância. Sendo mais abrangente, até se pode atribuir o surgimento dos bonecos-palito no mundo dos jogos no Atari e em similares. Isso, no entanto, parece-me uma interpretação errônea. Afinal, o intuito não era "estilizar" a silhueta humana. O fato é que era impossível (por limitações técnicas) que, mesmo o melhor artista desenhasse de maneira elaborada.

Assim, podemos pensar que os bonecos-palito Vêm, a princípio, como animações (quem nunca viu a interessantíssima série Xiao Xiao?) e são apropriadas por produtores de jogos. Por um lado, é um recurso interessante para quem não tem um artista gráfico para desenhar, por outro, pode ser visto como uma questão de estilo, mesmo. Dado que os tais bonecos-palito, apropriados por produtores de jogos, passaram a ser protagonistas das mais diversas missões, completa-se assim o sentido da brincadeira proposta por "Revenge of the Stickmen" (não por acaso, em uma linha até batido dos casual games, de "tower defense").

Em suma, se há o reconhecível em "tower defense", se há possibilidade de entendimento da brincadeira em "Revenge of the Stickmen", é porque já há um conjunto de pressupostos mais ou menos compartilhados por uma comunidade sobre aqueles campos semânticos - "bonecos-palito" e jogos do gênero. Isso é indício de uma sistematização e uma lógica própria de uma comunidade que vê aqueles clichês e aquelas recorrências em suas práticas cotidianas. Não tendo os jogos que funcionar a base de empréstimos de outros meios e de outras lógicas, dado que seus interlocutores começam a retroalimentar aquele universo, evidencia-se essa cultura gamer instituída.

O legal disso tudo (para mim, ao menos) é que, dentro do estabelecido há o campo fértil em que se pode executar a subversão. Quando iniciei meu mestrado, apenas pensava que o jogo poderia servir, feito um instrumento, para a reflexão social crítica alheia a ele. Hoje, já se mostra muito mais claro que um dos caminhos mais intrigantes de se estabelecer essa "crise" é questionar a própria naturalização dessa cultura gamer.

terça-feira, 23 de setembro de 2008

O "manifesto scratchware", parte III, traduzido

Em agosto, Janos Biro nos brindou com a última parte da tradução do "Manifesto Scrathware". Como afirma em seu próprio blog, Biro traduziu esse trecho "na íntegra, não por ser a mais importante, mas por ser a mais técnica. Trata-se de um FAQ sobre scratchware."

O autor já havia se mobilizado a traduzir as duas partes anteriores, conforme divulgado neste blog. Retomando a idéia:

"o Manifesto é uma jóia rara para a cultura gamer. Primeiro, por conta de ser um importante (além de ser um dos primeiros, quiçá, um dos únicos) registros de modos de se pensar jogos politicamente, frente uma inércia existente na produção de jogos com relação à demanda do mercado. Em segundo, pelo próprio interesse do manifesto (e do site que o hospeda, Home of The Underdogs) em valorizar a criatividade e o trabalho artístico dos jogos, e, ainda, a experimentação, a transformação - postura que coaduna com os princípios desse meu blog".

Em especial, esta terceira parte émuito interessante e didática ao mesmo tempo. Depois de compreender qual é a preocupação dos autores do ponto de vista ideológico, o leitor pode se situar, do ponto de vista prático, em definições, conceitos e perspectivas de um "scratchware".

Aqui, algumas pinceladas, para se ter uma idéia do que se está falando.

O que é scratchware?

A frase jogo scratchware essencialmente significa um jogo de computador, criado por um micro-time, com qualidade profissional de arte, design, programação e som para ser vendido a preços de livros de bolso.

Um jogo scratchware pode ser jogado por virtualmente qualquer pessoa que possa alcançar o teclado e ler. Jogos scratchware são breves (possivelmente quinze minutos a uma hora), extremamente rejogáveis, satisfatórios, desafiadores e divertidos.

Por que o termo scratchware?

Scratch significa um trocado, troco pequeno, moedas.

O que eu terei pelo meu dinheiro?

Um bom jogo, com qualidade profissional de arte, programação, escrita, design, som e música, e a um preço razoável e que vale a pena.





Definitivamente, vale a pena conferir o post na íntegra.

Isto é um "restart"

Vamos ver como tocar, mais uma vez, este barco. Produzir é preciso, mas produzir não é preciso.

A quem me acompanhou até aqui, um agradecimento especial. Passando o espanador, tirando o pó, um paninho na janela, a casa já está pronta para receber visitas...

sexta-feira, 4 de julho de 2008

Isto não foi um Game Over

Mas um overload.

Entrei em dois trabalhos, mais um curso, todos ao mesmo tempo. Estou tentando finalizar um artigo e mais outros escritos "por aí".

É uma fase da carreira complicada, porém, certamente, temporária.

Novidades virão.

Tentarei, ao menos, fazer, em breve, a segunda parte da "Instituição da Cultura Gamer". Só para não ficar "manca" a idéia.

terça-feira, 27 de maio de 2008

Extra! Extra! Jogue Nes Sem Baixar Emulador!

Exatamente isso. É um plugin do Firefox. É só baixar o plugin e, depois de instalado, apertar o atalho ctrl+shift+N e voltar aos velhos tempos.

http://www.firenes.com.ar/

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Comandos:

z
x
enter
rshift

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PS: É um plugin para FIREFOX. Se você usa outro navegador (Internet Explorer, por exemplo), não vai funcionar... =/

segunda-feira, 26 de maio de 2008

Jogos por que passamos: Bonanza Bros

Que tal, em vez de assumir o papel do "bem", estar do lado do crime, roubando e fugindo de guardas e seguranças? Idéia batida, lógico. Hoje, proposta mais banalizada que essa é rara. Transgredir a ordem já não tem mais nada de inovador.

Porém, na onda (ou contraonda? Aliás, gostei desse neologismo) da divulgação e dos incansáveis previews, reviews e treviews da nova edição do GTA, volto ao passado e rememoro um jogo clássico nesse sentido, talvez o primeiro em que o "roubo" era a missão a ser cumprida: Bonanza Bros. É certo que, se no original, os irmãos Robo e Mobo eram, de fato, ladrões, outras versões deram uma maquiada e colocaram-nos como "agentes testando sistemas de segurança". Mas a proposta de contravenção é mais clara no desenvolvimento da partida do que essa segunda história tenta passar. Alguns exemplos: o fim do jogo - a tela de "game over" - está associada com os irmãos na prisão. Além disso, toda vez que um dos irmãos consegue furtar um objeto, ele dá uma inconfundível risadinha, mostrando sua satisfação em conseguir executar a ação (aliás, se houvesse um concurso de melhores risadas de personagens de videogame, eu não hesitaria em votar na dos Bonanza como a melhor, seguida, em segundo lugar, da do cientista louco do Tom Jam and Earl).

Bem. O jogo, produzindo ainda em 1990, mostra uma inteligência e capacidade criativa incrível de seus produtores, evidenciadas por possibilidades ações muito além das convencionais para jogos desenvolvidos nessa época. Se hoje, falar em "stealth mode" é o padrão em muitos jogos, naquela época, da explosão dos beat'em-ups, o negócio era não fugir da briga, porradear todo mundo que viesse pela frente mesmo. Em Bonanza Bros, diferentemente, o objetivo era conseguir os itens requisitados. Caso se conseguisse fazer isso sem chamar a atenção, melhor ainda, pois menor era o risco de perder uma vida. A pontuação do jogo focava a rapidez com que se cumpria a fase, não o tanto de gente que se "matava". Até porque, em Bonanza Bros, não se mata ninguém, apenas deixam-se os adversários temporariamente desacordados.

Interessante que, para pode agir com essa discrição que se demandava do jogador, o jogo foi um dos primeiros (lembro-me de Blackthorne, para PC, usar semelhante recurso) que fez uso do recurso de se esgueirar nas paredes, ou seja, de se esconder, no próprio ambiente de jogo, ao "colar" na parede (ver imagem). Melhor ainda era na fase em que, ao fazer isso, o Robo (ou Mobo) disfarçava-se com a cabeça de robôs que estavam também posicionados rente à parede.



Aliás, o jogo era repleto desse tipo de recurso que dá um ar de flexibilidade e não previsibilidade: era possível esmagar os guardas com máquinas e alavancas, havia como descer de um prédio para outro através da fiação, entre outros. Em suma, Bonanza Bros era um jogo que impressionava tanto pelos recursos como pela possibilidade de ação (e que ainda impressionaria quem o jogasse pela primeira vez)

segunda-feira, 19 de maio de 2008

Quem joga quem?

Lendo "Juventude", de Coetzee, Nobel de Literatura de 2003 (muito bom o livro, principalmente para aqueles que saíram de suas cidades em busca de algo - mesmo sem saber o que era esse algo), chamou-me atenção um trecho no qual o narrador fala sobre jogos em específico. O que eu penso sobre o trecho, não sei. Ao menos, não ainda.

Contextualizando, John, o narrador, é um sul-africano que habita na Inglaterra na década de 60, na qual se sustenta por conseguir emprego como programador. Seu sonho, no entanto, é ser escritor. Falar mais que isso seria contar sobre o livro. E contar sobre o livro é um dos jeitos mais covardes de ferir a literatura. Mas segue o trecho:

"Ele continua assombrado com o fato de as pessoas poderem ser tão inteligentes quanto são na indústria da computação, e não terem nenhum outro interesse além do preço de carros e casas. Achara que isso era apenas a notória hipocrisia da classe média britânica se manifestando, mas Ganapathy [indiano] não é diferente.

Essa indiferença pelo mundo é conseqüência de um excesso de relacionamento com máquinas que dão a sensação de pensarem? Como ia se sentir se um dia deixasse a indústira da computação e voltasse para a sociedade civilizada? Depois de gastar suas melhores energias durante tanto tempo em jogos com máquinas, ainda seria capaz de manter uma conversação? Terá ganhado alguma coisa nos anos com computadores? Não terá ao menos aprendido a pensar logicamente? A lógica não terá então se transformado em sua segunda natureza?

Gostaria de acreditar que sim, mas não consegue. No fim das contas, não tem respeito por qualquer versão de pensamento que possa ser incorporada num circuito de computador. Quanto mais se envolve com computação, mais a acha parecida com xadrez: um estreito mundinho definido por regras inventadas, que engole meninos com um certo temperamento suscetível e os deixa meio loucos, como ele está meio louco, de forma que o tempo todo em que se iludem pensando jogarem o jogo, o jogo é que está jogando a eles". (COETZEE, 2005, 164)

Uia!

:O






Referência: COETZEE, J. M. Juventude: Cenas da Vida na Província II. São Paulo, Companhia das Letras, 2005.

quinta-feira, 15 de maio de 2008

A instituição da cultura gamer I: contextualização.

Falar sobre indícios da instituição da cultura gamer é algo um tanto, digamos, complexo. Primeiro, porque haverá quem (não sem razão) apontará o fato de que a tal "cultura gamer" está aí desde os primeiros videogames, dado que certas práticas sociais passaram a ser permeadas por esse uso. Em segundo, porque falar de cultura é sempre pisar em ovos - o termo possui uma pluralidade de acepções que, muitas vezes, mesmo em contextos menos amplos, pode causar discordâncias ou desentendimentos. Mas o tema parece relevante, para mim, quando as próprias manifestações do mundo gamer começam a utilizar referências do próprio meio no desenvolvimento dos seus jogos, que é o que se observou em posts anteriores (1,2) sobre jogos que, entendendo o gênero, modificam-no ou subvertem-no.

Assim, num arremedo de Ginzburg, procuro trazer as considerações sobre o assunto através de uma busca indiciária e - puxando sardinha para a área em que costumeiramente atuo - com o foco na linguagem. Peço desculpas por essa longa introdução sobre o assunto, dado que já havia falado que tentaria ser menos acadêmico nesse blog. Contudo, há coisas que, se não explicadas, acabam por dar coceira na gente. =D

Buscando na memória, é possível perceber que a grande tendência dos jogos, em momentos passados, era a de trazer outros mundos e outros contextos para aquele universo. Para isso, no entanto, o esforço realizado era no sentido de esconder, ao máximo, os limites e as convenções do jogo digital, procurando passar a idéia de que o jogo traduzia, ao máximo, a "realidade". Um exemplo: um "Fifa 94" (bem como um WE atual) quer "apagar", ao máximo, suas características de simulador, tentando buscar um "efeito de realidade" em seu jogador, uma idéia de que aquela simulação corresponde, tanto quanto possível, a um jogo de futebol de verdade. Lógico que, com isso, o contrato entre jogo e jogador tem que fazer vista grossa a muitas coisas - ninguém pode ser onze pessoas num campo de futebol, escalar o time e a formação, tudo ao mesmo tempo; futebol é um esporte de habilidade com os pés e não com os dedos da mão (no joystick); o boleiro sempre vai ver o jogo de sua perspectiva, impossível "mudar de câmera" ou ver o jogo acontecendo como se fosse numa TV, entre outros. Aliás, nesses tipos de jogos que se pretendem "reais", é sempre curioso ver a "evolução" de versões mais antigas para as mais novas - ela sempre denuncia que acreditávamos em uma grande mentira quando acatávamos que o jogo "traduzia a realidade". Quem não ouviu nunca, por exemplo, que a nova versão do jogo "x" estava "muito mais real"?

Outros jogos, apesar de não fazerem essa ponte entre práticas já estabelecidas fora desse universo (esportes, simuladores de vôo, etc.) calcavam-se, muitas vezes, em diretrizes e convenções de seus gêneros, naturalizando-as. Quem joga Sonic, joga Mário, por exemplo. Quem joga os dois, ou outros de "Plataforma" não terá dificuldade em migrar para "Beat-'em-ups como Double Dragon, Golden Axe ou Streets of Rage. Apesar das diferenças, há padrões mais ou menos repetidos - menu, opções, "continues", "vidas". As funções também não mudam muito - pular, atacar, especiais, etc. Mas não era usual questionar sobre a "espessura" dos jogos, esses elementos que os marcavam como videogames e não como qualquer outra coisa - filmes, jogos de tabuleiro, livro-jogo, etc.

Quando falo em espessura, quero dizer os pressupostos que o jogador assimila e acata antes de jogar. Talvez o mais comum que perdurou praticamente intocável até o surgimento do Wii é o de que apertar botões pode corresponder a realizar ações. ("A" ataca, "B" pula, "C" especial. Hein?) Um segundo, tão inverossímil quanto esse em qualquer outro meio é o de que um personagem pode ter mais de uma vida (queria ver se ninguém iria esbravejar ao ver um filme em que o cara morre umas três vezes e, como pena para isso, recomeça sua saga em um checkpoint qualquer). Isso sem contar a naturalização das "tramas" dos jogos, levando à sedimentação de certos gêneros. (Há algo mais próprio de videogames - ou fliperamas - que falar em "chefe de fase" e "chefão final", ou "chefe de jogo"?)

E onde quero chegar com isso? Bem, essa contextualização mostra que, em muitos casos, e principalmente, num tempo anterior ao nosso, a pretensão de realismo - criticado ainda em 2006 por Roger Tavares e Felipe Neves - não evidenciou como deveria o quanto o meio "videogame" tinha suas próprias convenções, tanto oriundas de seus limites e possibilidades (o que um jogo digital nos possibilita não é a mesmo coisa que um romance e vice-versa), quanto a partir de certas reiterações e reafirmações de jogos, que acabaram criando alguns "gêneros", como beat'em'up, platformer, tycoon, RTS, FPS, etc... hoje, muitos autores de jogos não só tomaram consciência dessa espessura dos jogos como começam a incorporá-la (em grande parte de maneira irônica, ou engraçada) na própria confecção do jogo, criando assim, uma metalinguagem do jogo, o que, parece-me, é a afirmação da consciência da cultura gamer pelos agentes nela inseridos.

(em breve, a parte II, onde procuro comentar algumas dessas manifestações vistas atualmente).

quinta-feira, 8 de maio de 2008

Pos or Not: preconceito x conscientização

Há algum tempo, na televisão brasileira, uma campanha para atenuar o preconceito frente a portadores de AIDS utilizava-se do seguinte recurso: colocava um grupo de jovens interagindo, falando, brincando. Nesse meio tempo, uma voz em off trazia o seguinte questionamento: éramos capazes de distinguir quem, daquele grupo, era portador do vírus da AIDS?

A idéia, em Pos or Not, desenvolvido pelo grupo mtvU (mesmos criadores de Darfur is Dying) é basicamente essa. Aparecem, seqüencialmente, várias fotos com breves descrições e o internauta é convocado a "chutar" se a pessoa em questão é soropositiva. Depois do chute, a próxima tela vem com a resposta (acerto ou erro) e com um breve comentário feito pela própria pessoa. Se ela possui o vírus, esse comentário explica quando a pessoa descobriu. Se não, há apenas uma "mensagem" da própria pessoa, geralmente relacionada ao assunto. Mais simples, impossível.

Ao se propor como jogo, no entanto, parece-me que fortalece a retórica de que "é impossível descobrir, pela aparência ou por dados externos, quem é aidético". Primeiro, porque o internauta é induzido a arriscar, a externar um julgamento precipitado. É a partir daqueles dados que ele irá tentar adivinhar. Ou seja, exige-se do "jogador" o preconceito, para então desmistificá-lo. Na TV, a propaganda fluía sem mesmo alguém tomar partido. Fluía, também, se eu trocasse de canal no meio dela. No caso do "jogo", o desfecho depende a agentividade do internauta.

Não vou entrar no mérito de se esse assunto está batido ou não. Para mim, sim. Para muitos que lerão esse texto, também. Mas há de se levar em conta que é um jogo que, graças à Internet, tem uma projeção mundial, e pode chegar a sociedades que mal sabemos como pensam e como se posicionam frente a esse assunto. A criação desse jogo já denota a sua necessidade - quem o criou não o fez à toa, mas consciente de que havia muito preconceito sobre o assunto. Além disso, haver, em paralelo, um site com um grande suporte para esclarecer dúvidas sobre o HIV é uma iniciativa louvável.

Em suma, ao se analisar serious games como esse, não se pode ter um olhar voltado somente para o que nós, em nosso contexto e com nossa noção de jogos e diversão podemos achar ou não do jogo. Em vez disso, há de se tentar localizá-lo no seu próprio contexto e entender, a partir disso suas vantagens e seus limites. Assim, é óbvio que nenhum fanático por jogos vai passar horas no site, "divertindo-se a valer" com esse mecanismo interativo que foi criado. Por outro lado, a própria simplicidade do jogo faz com que sua "resposta", ou seja, o efeito que ele quer gerar, venha muito rápido para o internauta que acessá-lo. O "combo" jogo e site parece funcionar legal para alguém que não tenha muita informação sobre HIV. No jogo, são desconstruídas possíveis crenças de "tendências" de pessoas de determinada cor, idade ou localidade serem mais ou menos propensas a terem o vírus. Para amparar essa desestabilização proposital, todo o site envolta do jogo conscientiza quem quiser se aprofundar no assunto sobre o vírus, crenças, fatos, etc.

Quando clamo (e reclamo) por qualidade na apropriação de mecanismos de jogos para a conscientização de jogadores e internautas, pode parecer que exijo um "virtuosismo", uma perfeição que só pode ser adquirida com uma verba enorme, oitenta cabeças extremamente criativas e um período de, no mínimo dois anos. Iniciativas como essa mostram que dá para ser bom mantendo-se simples.

sábado, 26 de abril de 2008

Morrer? Ou viver tentando?

Se você é um dos poucos que têm acompanhado o blog desde o seu surgimento, certamente terá uma certa sensação de déja vu ao ler o título desse post. Mas não, não estou me repetindo. Em uma leitura mais atenta, pode-se perceber que há uma mudança significativa de sentido entre este e um post anterior.

Esse tipo de olhar aguçado, aliás, é uma das características exigidas pelo jogo Karoshi 2.0, o qual eu descobri através de um comentário de Janos Biro. Assim como em The Unfair Platformer e IWBTG, Kotashi é um jogo que, partindo de uma certa "cultura" estabelecida e compartilhada acerca do gênero "plataforma", promove algumas subversões.

A primeira delas, e a mais significativa, ao meu ver, é no objetivo do jogo. É possível estabelecer um consenso de que, por mais diferentes que sejam os diversos tipos de jogos, nos diversos gêneros, há uma ação que deve ser sempre evitada: morrer. Certo? Bem, com a plataforma em questão, a resposta é não. Em Karoshi, o objetivo do jogador é fazer o personagem a ser comandado justamente encontrar meios de morrer (o que não é uma tarefa fácil!).



Aliás, não é sem propósito que, inclusive, o nome Karoshi remete (segundo pesquisas feitas na própria rede, pois entender Japonês não é uma habilidade desse que vos escreve) a uma idéia de "morrer por excesso de trabalho". Lógico que, como um jogo mais abstrato, a relação entre as performances possíveis no jogo e a idéia do título não é óbvia. Mas ao ver que há, no jogo, uma certa caracterização de um ambiente genérico de trabalho em escritório, somada a um conhecimento geral do papel que a profissão e o esforço produtivo é encarado no Japão, pode-se ensaiar a idéia de estar contida, nesse jogo, uma crítica social à opressão dessa "máquina do trabalho". Aliás, pertinente isso estar em um jogo com ares de "jogo casual", ponderando que esses são oásis em meio ao deserto de tédio de muitos trabalhadores.

Indo ao jogo em si: diferentemente do Unfair Plataformer (e mais próximo ao IWBTG) o Karoshi 2.0 "esconde" por trás do gênero plataforma um verdadeiro exemplar do gênero Puzzle. A resposta nunca é óbvia, porém é de possível percepção através da lógica. A tentativa e erro faz-se presente aqui também, e a divisão em fases curtas estimula o jogador a tentar sobreviver. Depende-se quase nada da habilidade manual do jogador e mais da construção de hipóteses diante do cenário exposto e de - vez ou outra - algumas dicas esparsas.

Porém, até aí (e tirando o fato surpreendente de um jogo ter como objetivo central "morrer") não há nada que diferencie muito o jogo de Puzzles travestidos de plataforma. A descrição acima cabe muito bem, por exemplo, ao Portal, "velho conhecido" dos gamers no universo de jogos casuais. O que há, então de tão intrigante?

Bem, basicamente, a originalidade do jogo está em sua metalinguagem. Jogo metalíngüístico? Como assim? Unfair Platformer era metalingüístico a partir do momento em que, conhecendo as convenções dos objetos em uma plataforma, modificava-as ao seu bel prazer, transtornando o jogador.

Karoshi, por sua vez, de um modo até mais complexo, BRINCA com as convenções do jogo - revisitando conceitos como "fase", "menu", "fim". É difícil explicar sem estragar a surpresa do próprio jogo, mas em poucos exemplos (joguem, colegas, joguem) tentarei explicar o que estou tentando explicitar. Quem não quiser que eu estrague essas surpresas, que jogue primeiro e depois termine de ler... ;)

Primeiro - há uma fase em que é impossível resolver o problema proposto, à primeira vista. A sua obrigação é coletar um número "x" de moedas. Você o faz, e o que acontece? Pedem para coletar mais moedas. Ocorre que, na fase, simplesmente não há mais moedas. Você pode tentar de tudo lá dentro (e provavelmente você vai tentar) até desistir e julgar que fez algo errado e reiniciar a fase. Quando você o faz, qual a surpresa ao ver que as moedas que você coletou permanecem lá (não deveriam) e na soma delas com as que reapareceram na tela, você consegue cumprir seu objetivo.

Outros exemplos: há uma fase pela qual você só passa se voltar em outra fase anterior e fazer outro caminho. Ou seja, a resolução da fase está FORA dela. Ainda - em determinado momento, o MENU do jogo transforma-se em parte de uma fase. Seu personagem caminha pelo menu, o qual, antes, só teria (como em qualquer jogo convencional) o objetivo de selecionar as fases ou sair do jogo.

Enfim, um jogo com esse caráter é interessante porque desnuda certas convenções às quais estamos tão acostumados que naturalizamos. Há filmes que brincam com isso, ou obras de arte (Magritte e seu cachimbo que o digam).


É louvável como um jogo simples e com poucos recursos gráficos e tecnológicos conseguem fazer isso de uma maneira brilhante, ao passo que milhões e milhões em dinheiro são gastos para se fazer mais do mesmo em muitos "gêneros" estagnados da grande indústria. Em certos momentos fico pensando o que poderia acontecer se déssemos metade desse dinheiro para gente que faz jogos como o Karoshi 2.0...

quinta-feira, 24 de abril de 2008

Artigo sobre jogos e criticidade - link corrigido

Há um tempo, a revista CROP, na qual publiquei o artigo "Cotidianos em jogo: Análise de Jogos Digitais sob uma perspectiva crítica" havia redirecionado os arquivos que a compunham. Eu não me atentei a isso, de início, e o link do artigo, colocado ao lado deste blog, ficou quebrado.

Agora, o link está corrigido. Para quem se interessar sobre o artigo em questão, ou quiser saber do que se trata, coloco aqui seu resumo:


Entendendo ser necessária a aproximação de educadores aos novos letramentos, defende-se aqui que a apropriação do meio digital por educadores engajados criticamente pode trazer benefícios à formação dos jovens. Essa idéia tem como pressuposto a preocupação da educação crítica de expor o educando a situações conflitantes de mundo, colocando em crise assim as crenças e os esquemas interpretativos já estabelecidos. A análise deste artigo tem como foco os jogos digitais e tomou como objeto de estudo o simulador da vida cotidiana The Sims. Verificou-se, previamente, na proposta do software, um conjunto de valores e padrões culturais salientes, como o individualismo, o consumismo e a busca por popularidade. Posteriormente, analisando o jogo em uso, buscou-se descrever, primeiro, como esses valores, em sua concretização virtual, argumentam a favor da visão de mundo previamente assinalada. Em segundo lugar, como o The Sims limita a ação do usuário que opta por caminhos não previstos pela orientação ideológica posta. Tais reflexões demonstram ser elucidativas para a área na medida em que mostram como esse tipo de jogo pode ser uma forte ferramenta tanto para uma visão crítica de mundo quanto para uma veiculação de valores culturais hegemônicos.

Palavras-chave: jogos digitais, educação crítica, novos letramentos


Em suma, é um trabalho relacionado à como é possível detectar e, a partir disso, subverter, os padrões e os discursos estabelecidos em jogos produzidos pela indústria cultural. Afinal, não se pode pensar apenas na criação de jogos indepententes, plenos de reflexão política para gerar um pensamento crítico. É necessário também apropriar-se do que existe da cultura dominante de jogos e destrinchar, desconstruir, subverter, para que existam ainda mais espaços propícios para esse tipo de reflexão social.

sexta-feira, 18 de abril de 2008

O "manifesto scratchware", parte II, traduzido

Tive a feliz surpresa de o próprio autor da tradução da primeira parte do Manifesto Scratchware - Janos Biro - comentar aqui no blog e anunciar que já realizou a segunda parte da tradução.

Para quem não acompanhou o post anterior sobre o assunto, o Manifesto é uma jóia rara para a cultura gamer. Primeiro, por conta de ser um importante (além de ser um dos primeiros, quiçá, um dos únicos) registros de modos de se pensar jogos politicamente, frente uma inércia existente na produção de jogos com relação à demanda do mercado. Em segundo, pelo próprio interesse do manifesto (e do site que o hospeda, Home of The Underdogs) em valorizar a criatividade e o trabalho artístico dos jogos, e, ainda, a experimentação, a transformação - postura que coaduna com os princípios desse meu blog.

Agora, além de termos acesso, em português, à primeira parte do manifesto, pode-se conferir (e vale muito a pena) a segunda parte, também já traduzida.

Para "sentirem", de antemão, a postura dos autores do manifesto, segue um pequeno, mas representativo trecho:


"Já pensou porque a Exxon, a Microsfot, a Monsanto e todos os seus amigos fazem tantos comerciais sobre o quanto eles são bons? É porque eles tem que esconder a verdade de nós. Vampiros controlam o mundo, em forma de corporações.
[...]Então a indústria de jogos foi pega por este esquema. A grande quantidade de sangue, quer dizer, capital, que é requerida para fazer um jogo hoje significa que mais e mais grupos pequenos de desenvolvedores são forçados a se juntarem à grandes corporações. Ao mesmo tempo, as condições de trabalho só pioram. Palestras de incentivo e motivação são cada vez mais comuns. Lavagem cerebral para fazer os escravos amarem seus mestres vampiros com cada vez mais dedicação."

segunda-feira, 14 de abril de 2008

Jogos críticos x Jogos bons

No almoço que antecedeu a defesa de meu mestrado, em fevereiro, deu-se uma cena que ficou gravada em minha memória. Estávamos, eu e familiares, num restaurante vegetariano, alternativo, ou algo assim. Daqueles que não tem carne, mas que tem bastante fritura e tempero, com uma leve pitada de culiária oriental.

Pois bem, minha mãe experimenta uma torta de batatas e carne de soja. Logo que vou pegar meu segundo prato, pergunto qual o gosto dessa torta, para ver se compensa eu comê-la. Ao que responde minha mãe:

- Ah, é boa. Levando em conta que é de soja, está gostosa.

***

Essa pequena anedota ilustra um certo posicionamento que, julgo, deve ser a todo custo evitado ao se avaliar algum produto ou artefato. Algo como agregar, de antemão, um valor a mais a um filme mediano por conta dele "ser baseado em fatos reais". E daí? É um filme, ainda, e deve ser analisado como tal.

Temo muito, dentro dessa tentativa de divulgar, exaltar, defender a criação de jogos sérios e, principalmente, de jogos críticos, que se tenha uma certa "clemência" por jogos com "boas intenções", mas que, por um motivo ou outro, fiquem muito aquém do que um jogador pode esperar de um jogo. Externo essa minha preocupação, latente há muito tempo, por conta de uma análise particular do jogo "Deliver the Net" e também pela análise sobre esse mesmo jogo realizada por Ian Bogost no site Water Cooler Games.


O visual, como bem disse Bogost, é atraente e chama a atenção, mas é desperdiçado num jogo em que impera uma lack of depth as a simulated experience (BOGOST). O autor ainda ressalta muito bem que, do modo que foi construído, Deliver the Net acaba mais possuindo um perfil mais de um veículo complexo de divulgação do que um jogo.

Em poucos segundos de interação, isso já pode ser percebido. O objetivo é entregar redes para as famílias em cabanas em um ambiente desértico africano. Para isso, não há desafios ou dificuldades, não há alguma tensão (nem uma mínima, por exemplo, de o protagonista "cair da moto"). A velocidade com que a moto pode andar é sempre a mesma, sempre lenta. Os obstáculos a serem desviados são poucos e fáceis. Não há como não cumprir o objetivo, a menos que se canse do jogo antes (o que é uma grande propaganda contra o próprio site).

Podem espernear, falar de baixos orçamentos, de complicações. Mas exemplos de jogos casuais que têm explodido com sucesso em Kongregates da vida mostram que o buraco é bem mais embaixo. Se há gente boa para fazer um "Fancy Pants", ou similares e colocar na rede, é de se constatar que gente boa existe para fazer coisas legais nessa linha. Por outro lado, há poucas coisas que vêm surgindo que sejam realmente boas e que fujam do par "Persuasive Games" e "Molleindustria".

É de se continuar incentivando esse caminho, que é muito promissor, mas que vem sendo constituído, em grande parte, por tortas de batata com soja.

Em tempo: percebam que, neste post, estou sendo até muito mais básico e superficial do que o Bogost, embora endosse sua opinião. Ele reclama que o jogo não tem profundidade. Eu, dessa vez, só queria que o jogo fosse legal.

quarta-feira, 9 de abril de 2008

Mecânica I - Alavancas, planos inclinados e lápis de cor.

Eu não era dos piores em física. Tampouco dos melhores. É que entender que o vetor tal e qual fazia com que aquela bolinha acelerasse ou diminuísse era muito para a cabeça.

Talvez se, junto com minhas aulas, eu tivesse a experiência de poder brincar com o jogo Magic Pen ou algum similar, eu teria aprendido mais facilmente algumas noções básicas. E, talvez, assim, hoje eu demorasse menos de meia hora para passar de cada fase.
Lógico que, para implementar jogos como esses em ambientes educacionais é preciso ponderar que, por trás dele, há um sistema de algoritmos com premissas sobre o valor da gravidade, da força, do atrito, etc. etc. Claro que é tudo convenção e esse tipo de informação deve ser explicitada. Mas, enfim, convenção por convenção, a gravidade não mede necessariamente 9,8 (ou, em alguns casos) 10,0 m/s² (era essa a medida, não?). E isso não impedia ninguém de achar o resultado das questões de vestibular que tínhamos que fazer, incessantemente.

quinta-feira, 3 de abril de 2008

Vencer? Ou morrer tentando?

Qualquer manual de criação de jogos que se preze vai falar que um bom videogame é aquele que contrabalança o desafio e a dificuldade com os recursos oferecidos ao jogador, a premiação e a habilidade prevista desse. Mas e daí? E, se, só de sacanagem, alguém quiser criar um jogo que não tem nada de balanceado?

Bem, já tiveram essa idéia. Uma das referências no mundo cibernético de jogos que vão nessa linha é o I Wanna Be The Guy.

A história não podia ser mais simples – o protagonista, como indica o título, simplesmente quer ser O CARA e para tanto, tem que passar pelas mais difíceis provações. Agora, não há tempo para você se adaptar e ir melhorando, pegando o jeito da coisa. Não sacou o jogo? Bem, vai ficar eternamente na primeira tela. Isso, porque o jogo é extremamente difícil, trazendo por muitas vezes, injustiças – surpresas como o aparecimento de espinhos onde, até então, não tinha nada e nem indicava a possibilidade de tê-los. Para quem não quer jogar, mas quer sentir qual o nível do jogo, recomendo esse vídeo de um percurso de um gamer.

Ok. Mas qual a graça de um jogo quase impossível? Na verdade, o desafio, altíssimo, prevê um jogador de bastante habilidade e paciência. Ou seja, não é que o jogo esteja desequilibrado, mas a sua audiência é muito específica. Isso serve para desmascarar, em partes, essa idéia de “equilíbrio”, de “fluência”, como pressupõe tutoriais feito o What is a Good Game, de Overmars. Há um público para esse jogo, e se houvesse outro ainda mais difícil, teria mais gente para tentá-los. Gente que – como o personagem – desejaria ser O CARA, ao menos no mundo dos videogames, dos rankings e do youtube.

Mas eu introduzi essa questão para falar, na realidade de um outro jogo, de estrutura semelhante, mas que me agrada um pouco mais - The Unfair Platformer. O gráfico é mais precário em muitos aspectos, há menos níveis e, como é possível de observar dentre os usuários do Kongregate, muitas vezes ele é tratado como cópia ou como artigo inferior ao IWBTG.

Eu não vou por esse caminho. Além de ser fascinado pela música (todo ex-jogador de Sonic vai compartilhar da minha opinião), vejo nele uma outra proposta. IWBTG é um jogo para ser dificílimo, para dar o prazer de se sentir superior, vencedor, a cada passo. Seu foco está na dificuldade, trazendo pitadas de injustiça para complementá-lo.

The Unfair Platformer, como o nome diz, é um jogo criado para ser injusto. Seu princípio é o de "sacanear" o jogador. Isso, do ponto de vista da linguagem, é extremamente subversivo. Todas as lógicas prévias que o jogador leva para o jogo podem, pouco a pouco, serem desconstruídas. Todo espaço é espaço de suspeita. Tudo parece aleatório, detonando o conhecimento do “gênero” plataforma, que os gamers trazem desde o primeiro Mario Bros.

Especulando mais além, pode-se dizer que o jogo imprime uma outra lógica, exige outro trabalho cognitivo do jogador. A base do uso de jogos é tentativa e erro a partir de deduções e conhecimentos prévios. Se uma pedra verde mata, evite as pedras verdes. Em “Unfair Platformer”, a constante e aleatória mudança dos valores de cada signo exige muito mais memorização e construção de hipóteses localizadas. O que serve para três moedas pode não servir para a quarta. É certo que há uma estrutura – montada a partir de uma lógica mais constante – que sustenta tais subversões. Mas o recado, do início ao fim é de que “você não sabe o suficiente”. É necessário morrer – e várias vezes – para aprender. E, caso você vá jogar de novo depois de um tempo – morrerá tudo de novo, a menos que tenha a famosa memória de elefante.

Ou seja – o que o jogo evidencia é que há um tipo de letramento específico para jogar, e esse letramento é ligado a “tipos relativamente estáveis de enunciado”, que é a definição de “gênero do discurso” segundo Bakhtin. Um jogo que subverta essa lógica desestabiliza por completo o jogador, que tem que rearranjar seus esquemas interpretativos para voltar a “ter sucesso” na partida. Aliás, a própria noção de sucesso muda – aqui, no caso, é morrer o menos possível a cada checkpoint.

quinta-feira, 27 de março de 2008

O "manifesto scratchware" traduzido na Gamecultura

Tudo que é bom deve ser divulgado. E, de fato, no site da Gamecultura há muitas coisas boas. Ele, em si, deve ser uma passagem obrigatória para qualquer amante dos jogos.

Porém, em particular, chamou-me atenção o trabalho e a dedicação de um membro em específico da comunidade - Janos Biro. Num post recente ao site, ele se deu o trabalho de traduzir a primeira de três partes do "manifesto scratchware" do site Home of the Underdogs.

Para quem não sabe, o site dos "Underdogs" é um dos principais e primeiros sites de jogos que fugiram daquela balela de simplesmente trazer reviews, imagens, previews e walkthroughs de games comerciais. A princípio, e em uma análise desatenta, parece apenas um site de abandonwares. Mas, para quem só está entrando agora no "bonde" da cultura gamer, vale dizer que o site tem profundo interesse e dedicação em explorar formas criativas e não convencionais de se desenvolver jogos e apóia fortemente produtores independentes e jogos que não se limitam às conservadoras e repetitivas demandas de mercado.

É uma postura interessante, pois incentiva a parte do jogo que mais se aproxima da arte - o trabalho criativo, a "sacada", a inovação, a desestabilização de estruturas postas. E o "manifesto scratchware" traz bem fortemente essa postura. Isso, no verão (nosso inverno) do ano 2000! Para ler a versão traduzida da primeira parte, clique aqui.

Aguardo (aguardamos, Janos!) as próximas partes da tradução para postar aqui, também. ;)

terça-feira, 25 de março de 2008

The Sims Carnival - democratização da produção de jogos?

Qual user nunca quis produzir seu próprio jogo, achando que tinha uma idéia para lá de genial? E que, apesar disso, até agora não teve tempo para se aprofundar em programação, game design ou coisas do gênero?

Aposto que muitos. Apostos que estes, também, vez ou outra, tentaram ir por caminhos intermediários usando ferramentas de produção para "não programadores" como o Klik & Play, o Game Maker, ou o RPG Maker. Contudo, talvez, mesmo esses softwares dependessem de uma iniciação e uma aplicação maior para se entender.

Agora, uma alternativa a isso está sendo esboçada. Trata-se do "The Sims Carnival", numa versão beta fechada, para o qual submeti inscrição e acabei de ser aprovado (só para ver "qualé"! =P ). Parece-me, a princípio, que o espaço pretende ser uma "mistura" de sites que hospedam e compartilham jogos de usuários como o Kongregate, com uma interface de criação de jogos bastante amigável e facilitada, somada a uma ferramenta de criação de jogos um pouco mais elaborada.

Parece-me que essa democratização da produção de jogos através de criações "modulares" era uma vontade antiga do ludólogo Gonzalo Frasca, explicitada, ainda, em sua dissertação de mestrado no longínquo (estamos falando de cultura gamer, pois!) ano de 2001.

Pensar em ensinar através de módulos pré-fabricados pode ser "democratizar" até um certo ponto. É legal sentir-se autor de um jogo, mesmo que ingênuo, rompendo a barreira do jogador no processo criativo. Por outro lado, quanto mais "opaco" é o programa com o qual nós trabalhamos, menor a chance de se compreender quais discursos e lógicas estão movendo nossa própria criação.

Turkle (1997), traz esse impasse, justamente, ao questionar se o que se deve é ensinar o "uso" das ferramentas que o computador oferece (algo que ela chama de "cultura da simulação"), ou se o melhor caminho é mostrar justamente, como se dá o processo de funcionamento do computador, reduzindo-o à explicitação de sua lógica (o que é comumente defendido na chamada "cultura da calculadora"). Ela resolve esse impasse - no qual ambos os lados tem argumentos plausíveis, considerando que:

"one can imagine a third response. This would take the cultural pervasiveness of simulation as a challenge to develop a new social criticism. This new criticism would discriminate among simulations. It would take as its goal the development of simulations that help their users understand and challenge their model's built-in assumptions (Turkle, 1997, 82)".

Penso que, nesse sentido, o The Sims Carnival pode ser, ao menos, um início para aproximar àqueles que ainda não dominam nem julgam (sendo trabalhosa ou não) "óbvia" a produção de jogos. Assim como uma geração de "nerds", logo após o "declínio" do DOS foi formada em Windows e, com os conhecimentos adquiridos migrou para o Linux, o simples contato com "o outro lado" do jogo pode ser um estímulo para o aumento da democratização de sua produção.

Porém, contudo, entretanto, todavia, isso também depende de como essa ferramenta em específico (e todo o espaço do The Sims Carnival, ou qualquer similar que venha a lhe fazer concorrência) vai se comportar e evoluir. Até porque, de uma Eletronic Arts, não se espera que um espaço como esse sobreviva gratuitamente, como o é, ainda, em seu período de testes. Ou seja: já é muito falatório para algo que; de um lado, nem foi muito bem observado; de outro, mal abriu sua fase de testagem.

Mas vai que alguém, a partir disso, finalmente resolva por à prova a vontade de Frasca de maneira aberta e gratuita?

terça-feira, 18 de março de 2008

ICED - "I Can End Deportation" - Conclusões

Essas conclusões se referem à analise do jogo apresentada logo abaixo.

Em primeiro lugar, o jogo ICED se propõe polêmico ao veicular um discurso diferente ao discurso oficial dos EUA frente aos imigrantes. É algo louvável e a repercussão que o jogo atingiu num nível internacional torna, sem sombra de dúvidas, a iniciativa louvável. Além disso, as discussões que se seguiram em vários sites que hospedam e divulgam o jogo mostram como ele, de fato, cumpre sua função enquanto jogo crítico - polemizar, trazer o debate, desestabilizar posições ideológicas e discursos postos.

No entanto, não é o modo que mais me agrada de se criar jogos nessa direção. Ele não é divertido, não é atraente, não possui desafios. Além disso, resolve questões complexas - como a das injustiças da deportação de imigrantes nos EUA - através dos mais manjados PUZZLES - "sistema pergunta e resposta" e "pega-pega". Além de "idiotizar" a proposta do jogo e mostrar um desequilíbrio entre a qualidade gráfica e a lógica do software, entendo que esse tipo de "solução" pode acarretar em discursos que vão contra a própria lógica do jogo.

Qualquer um, a partir da proposta final do jogo, pode ponderar que, nos EUA, para se conseguir ser livre, tem que vencer os agentes de deportação no cansaço (fisicamente falando). Poderia até ser uma metáfora satisfatória, se o jogo se limitasse a isso. No entanto, para chegar nessa "corridinha final", totalmente despropositada, tem de se passar por um longo e extenso quiz e por um trabalho de "coletar pílulas" sem a dinâmica e a graça do Pac-Man. Outro discurso pernicioso do jogo é que dentro da detenção o imigrante tem a chance somente de apodrecer ou de ser deportado. É extremamente frustante ter o trabalho que se tem para chegar no fim dessa parte do jogo sem NENHUMA CHANCE DE VITÓRIA.

Deve-se lembrar que, para se existir um jogo, há de se existir desafio. Quando não se há chance de vitória ou quando esta está muito além das possibilidades do jogado, não existe desafio, nem fluência na partida e a própria idéia de "jogo" fica comprometida.

Entendo que talvez essa seja a proposta do jogo, frustar e irritar quem se disponha a interagir com ele. Aliás, nesse sentido, o jogo se assemelha muito à proposta de Darfur is Dying, cuja lógica conduz o jogador à derrota e ao debate fora do ambiente do jogo. O problema é que nem um, nem outro cativam o jogador por muito tempo. Nesse sentido, em vez de servirem como propulsores de uma reflexão social crítica, eles podem ser facilmente deixados de lados para o jogador escolher algo mais cativante.

Por fim, como "chamariz" para a discussão a ser proposta, o jogo tem méritos. Desde o início ele joga, agressivamente, informações que devem deixar o "cidadão de bem norte-americano" de cabelos em pé, obrigando-o a tomar um posicionamento (nem que seja o de negar para si mesmo aquele discurso exposto). Como jogo, é ingênuo e não cativa, além de possuir discursos que não se alinham com a proposta de conscientização pregada.

ICED - "I Can End Deportation" - Análise




ICED - "I Can End Deportation" - é mais um jogo sério que pode ser encaixado na definição de "jogos digitais críticos". Esse termo engloba jogos que, na sua interação, procuram instigar a reflexão social crítica de seu(s) jogador(es). É um jogo ambientado nos EUA - como não raramente o são os artefatos culturais produzidos naquele país - mas com uma temática pretensamente global: a imigração e a deportação dos chamados "residentes ilegais".

Digo pretensamente por que, ao se deparar com o jogo, vê-se que seu direcionamento está muito mais atento a "educar" o cidadão norte-americano sobre as injustiças da deportação no país para tentar fortalecer a luta em defesa dos direitos humanos nesse caso em específico. Claro, o jogador que é de fora aprende também algumas coisas pontuais e, além disso, pode fazer ciberneticamente sua militância contra esse absurdo (o que não deve surtir muito efeito para os altos salões do governo Norte-Americano).

Ele aparece como um problema global e chega ao terceiro mundão mais, portanto, por conta do fato de que polêmicas que vêm de lá viram muito mais facilmente notícia por conta da posição privilegiada do país frente ao mundo.

Mas o que importa é que o jogo chegou às minhas mãos (ou minhas mãos chegaram ao jogo, considerando que nós é que geralmente buscamos, no meio digital, aquilo que nos interessa) e resolvi estrear o blog com ele. Aliás, com uma análise mais geral dele a partir de conceitos desenvolvidos em minha dissertação de mestrado.

Pode-se dizer que os gráficos são bastante atraentes e, de início, podem levar o jogador a uma sensação de imersão. Porém, no decorrer do jogo, fica a sensação de que gastou-se tempo demais com gráfico e de menos com a própria dinâmica do jogo.

No fundo, no fundo, o jogo não passa de uma espécie de quiz em um ambiente virtual. O "tema" do quiz é relacionado à imigrantes e deportação, e possuem um apelo de militância e conscientização. O próprio modo como as perguntas e as situação são postas, somadas à dica inicial de permanecer "low-profile" já indicam, praticamente, o que deve ou não ser respondido, acabando com qualquer surpresa ou graça no jogo. Nada ali parece inesperado ou aleatório.

Para não dizer que o jogo se limita a esse quiz, vale lembrar que na soma de perguntas erradas ou de ações tomadas de modo incorreto aumenta-se o número de policiais na cidade. Nesse momento, o jogo aquire ares de PACMAN. Em vez das tradicionais pílulas, no entanto, o objetivo do jogador é continuar indo atrás de perguntas sobre deportação para responder, além de fazer "boas ações" do tipo "ajudar velhinhas a atravessar a rua".

Qualquer tropeço nessa etapa, o imigrante é enquadrado por um agente e vai parar num entreposto para imigrantes ilegais, uma espécie de presídio para imigrantes. Nessa segunda parte do jogo, adivinhem? O jogador tem que continuar respondendo perguntas e arrecadando pontos para marcar um julgamento e sair da detenção (para voltar ao PAC-QUIZ). O detalhe é que procurei mais de uma vez jogar essa etapa e, em todas as vezes que consegui um julgamento, eu não era aceito. Talvez tenha sido inabilidade minha. Mas a verdade é que essa etapa não tem nenhuma graça e jogar mais de uma vez, só com fins de estudo, mesmo. Em suma, ao julgamento ser recusado, simplesmente NÃO HÁ MAIS NADA A FAZER senão passar o resto da vida no ambiente da detenção ou pedir para ser deportado.

Caso, ainda na primeira etapa, o jogador consiga responder tudo do modo como o jogo espera, ele passa por uma provação final: fugir por um tempo determinado de vários agentes. Caso ele consiga, é-lhe prometido a sua legalização no país. Caso contrário, ele vai para a detenção.

Confesso que, depois da segunda vez em que respondi tudo corretamente e não consegui fugir dos tais agentes, desisti de jogar.

Para baixar o jogo, entre no site oficial ou clique diretamente aqui.

quarta-feira, 12 de março de 2008

Jogos por que passamos: X-Com Apocalypse

Como consta no subtítulo desse blog, além de discutir questões de criticidade e ideologia, esse espaço pode ser interessante para analisar o jogo dentro do âmbito cultural de uma maneira mais ampla.



Nesse sentido, inauguro uma série de posts - que certamente serão os menos "sisudos" desse blog" - denominada "Jogos por que passamos". Nada mais será do que uma seção nostálgica, de jogos que marcaram época (na minha opinião).

Começo com o "X-Com: Apocalypse". Não foi o jogo mais comentado, nem o mais elogiado da série, mas foi o que mais me cativou. Talvez eu estivesse ainda empolgado com os jogos da Maxis e a cidade isometricamente representada me parecesse mais interessante que a representação do planeta em "UFO: Enemy Unknown".

De qualquer forma, era um jogo muito bem feito e com gráficos razoavelmente elaborados para a época. A grande sacada da série foi a divisão entre "jogo estratégico" e "jogo tático". No primeiro, tentava-se manter a ordem na cidade, procurava-se desenvolver pesquisas, aperfeiçoar os membros da X-COM, além de estabelecer relações diplomáticas entre outras organizações e facções da cidade. Um jogo de gerenciamento que não devia nada a jogos da Maxis ou Tycoon. Porém, não é só de gerenciamento que vive uma equipe de aguerridos combatentes de aliens: eis que surge, pois, o jogo tático! Este, com uma lógica semelhante a jogos como Jagged Aliance ou RPGs por turno de visão isométrica em geral era igualmente emocionante.

Como eram odiosos aqueles ETs que pareciam uns balões amarelo-mostarda que surgiam do nada e "sugavam o cérebro" do soldado, fazendo-o voltar se contra a equipe! Ou, pior: depois de se juntar três ou quatro soldados para abater aquela "minhocona" verde gigante, eis que dentro dela estão mais quatro minhoquinhas marrons. As malditas se movimentavam rápido e iam todas num mesmo soldado, matando-o facilmente caso você não as liqüidasse.


O equilíbrio entre o jogo tático e o estratégico era o fundamental e foi o que me prendeu por tanto tempo no jogo. Negligenciando a parte estratégia, seus combatentes, suas armas e seus acessórios ficavam defasados, tornando a luta no campo tático muito mais difícil. O plano tático, embora fosse um pouco repetitivo, sempre trazia a inovação nos acessórios recém-descobertos, no uso das informações obtidas nas pesquisas ou até nos novos aliens que, pouco a pouco surgiam. Nada mais espantoso que, finalmente, ir à outra dimensão e lutar contra o aliens na casa deles!

Bem, espero que alguém também tenha se apaixonado por esse jogo e que este breve "ensaio" tenha ajudado a rememorar e a saborear os bons desafios do X-Com: Apocalypse.

terça-feira, 11 de março de 2008

Revista PONTOURBE no.2 está on-line! (E com ela, eu!)

A revista PONTOURBE é uma iniciativa do Núcleo de Antropologia Urbana da USP (N-A-U). A revista é um interessante espaço de discussão para todos que estão imersos em uma sociedade urbanizada, pois tece reflexões sobre temas com que muitas vezes nos deparamos de maneira não refletida no dia-a-dia. Que práticas, por exemplo, estão por trás do "esperar troquinho" no centro de uma cidade como Porto Alegre? Ou o que há para ser dito e aprendido sobre o universo e a cultura que envolvem a prática dos sujeitos surdos?

Além de temas estritos da Antropologia Urbana, a revista abre espaço para estudos em áreas afins. Nessa segunda edição - que prima pelo estilo conciso, limpo e bem acabado - tive a oportunidade de participar da seção Cir-Kula, que abre espaço para "contribuições de autores que, sem serem antropólogos, circulam em nosso meio e utilizam conceitos, métodos ou estratégias de pesquisa próprias da Antropologia, como forma de problematizar e ampliar o horizonte dos recortes de estudo em suas próprias áreas".

Minha contribuição em específico nessa revista foi com o trabalho "Entre a liberdade e a coerção: videogames e construção de sentido", o qual se propõe a analisar com jogos digitais, no ato da interação, podem servir como mediadores para se argumentar ou persuadir em favor de pontos de vista ideológicos em específico, bem como tenta deflagrar brevemente como esse mecanismo discursivo funciona em ação.

Há trabalhos muito interessantes na revista, com temáticas atuais e engajadas e - proposta interessante vinda de uma instituição marcadamente acadêmica - com um estilo acessível a não especialistas na área de antropologia.

Vale a pena conferir...


segunda-feira, 10 de março de 2008

Videogames a sério. É sério?

Bem, está dada a largada neste blog para se falar sobre videogames.

Depois de ter defendido minha dissertação de mestrado com sucesso (EEEEEEEEEEEE!) sobre o tema, finalmente me dedicarei a uma vontade antiga - tentar criar um espaço de discussão sobre jogos no Brasil que não se limite à análise de se um jogo tem ou não belos gráficos ou se vale ou não a pena comprá-lo.

Tenho uma certa intenção (melhor talvez seja pretensão) de fazer desse blog um dos pontos de encontro de interessados nos jogos digitais de modo geral ou de curiosos sobre linguagem e tecnologia.

Tentarei trazer algumas referências de um olhar analítico sobre o tema, embora não queira academizar esse espaço que - por definição - não é formal (ou, ao menos, não possui a mesma formalidade acadêmica).

Em breve vou disponibilizar minha dissertação on-line para download. Ela está em fase de revisão final para ser enviada à bliblioteca da UNICAMP. Nesse meio tempo tentarei adiantar e explicar toda e qualquer referência que eu possa fazer dela dentro deste espaço.

Em linhas gerais, posso adiantar que, nesse trabalho em específico, tentei ver como os jogos digitais podem, na interação, serem objetos de persuasão e de disseminação de pontos de vista ideológicos em específico. Ou seja, defendo que nenhum jogo é neutro, todos são marcados pelo seu contexto de produção. Assim como os textos, os partidos políticos, as propagandas, eles possuem discursos defendendo pontos de vista (e fazem isso através de mecanismos bem particulares).

Mas quem se interessar a fundo pode, em breve, baixar a dissertação. :D

Sejam bem vindos!